Foi inteiramente filmado nos EUA, conta com actores americanos… mas é um filme português. Pouco depois de lançar o DVD, o realizador Fernando Fragata revela ao DN como foi a experiência de viver em Contraluz. Este texto foi originalmente publicado no Diário de Notícias, no dia 6 de Setembro de 2011.
Homem da publicidade, da televisão e dos telediscos, Fernando Fragata é hoje também um dos realizadores portugueses mais invulgares da sua geração. Depois de realizado o telefilme Pulsação Zero em 2002, o cineasta atingiu a notoriedade comercial com Sorte Nula (2004), 10º filme português mais visto em Portugal. Apesar do sucesso, o realizador foi consciente de que havia que voltar “à estaca zero”. E assim surge a sua obra maior, em produção e em êxito comercial: Contraluz, que levou no ano transacto nada menos que 83.724 espectadores.
O facto de ser o nono filme português mais visto torna ainda mais peculiar o facto de Contraluz, filme centrado em histórias paralelas ligadas pelo destino, parecer mais ter vindo de Hollywood que de qualquer outro local em Portugal.
O realizador justifica a afluência às salas de cinema por “uma conjugação de vários factores.” Na sua opinião, os espectadores “gostaram do trailer” e o “assunto de que o filme trata cativou-os. De outro modo não tinham lá posto os pés nas salas de cinema”, opina.
Inteiramente filmado nos EUA, tem um elenco que mistura actores norte-americanos (caso de Scott Bailey e de Skyler Day) e portugueses (Joaquim de Almeida, Ana Cristina Oliveira e Evelina Pereira) e é falado em inglês (a sua primeira longa-metragem, a comédia romântica Pesadelo Cor de Rosa, era também falada na língua estrangeira). Fernando Fragata não vê como criar um “star system” nacional sem actores de televisão, declarando que “o dinheiro que existe em Portugal para fazer filmes é tão pouco que nenhum actor poderia sobreviver só a fazer filmes portugueses.”
Para além de realizador, Fragata vestiu a pele de argumentista (“Tento escrever algo que me agrade e me entusiasme e que me faça acreditar que o público também irá gostar”, revela ao DN) e, também, de director de fotografia, operador de câmara, montador e produtor.
Após ter tido a oportunidade de ver o filme antes da sua estreia comercial, o actor António Feio (que trabalhou com o realizador em Sorte Nula) comentou Contraluz num vídeo que alastrou na Internet. “Se há coisa que eu costumo dizer é ‘aproveitem a vida e ajudem-se uns aos outros. Apreciem cada momento, agradeçam e não deixem nada por dizer, nada por fazer’. Esta é uma das fortes mensagens deste filme”, reconheceu o actor, que viria a falecer no dia 29 de Julho de 2010, pouco depois de Contraluz ter estreado no cinema.
“Dias antes dele falecer eu liguei-lhe e disse-lhe que lhe ia dedicar o filme, facto que o deixou emocionado e a mim também”, relembra o realizador ao DN. “Foi uma dedicatória ainda em vida, o que me traz algum conforto emocional, por ter tido ainda essa oportunidade de lhe expressar a minha admiração e agradecimento pela generosidade que sempre o caracterizou.”
Por um cinema mainstream que chegue ao seus espectadores
O drama Contraluz, que estreou em Portugal a 22 de Julho ao lado de A Origem, de Christopher Nolan, ilustrou, apesar dos bons resultados, a dificuldade por que passa um filme português para chegar ao público nacional.
Apesar de considerar que existe espaço para um cinema dito mainstream (ou dirigido ao grande público) em Portugal, Fragata critica ao DN a falta de financiamento: “os incentivos para quem consegue levar publico ao cinema são irrisórios”.
O realizador demonstra igualmente uma preocupação quanto à selecção na exibição dos filmes nas salas de cinema, referindo que “o mundo inteiro compra filmes americanos e pouco se interessa por filmes provenientes de outros países. São capazes de pagar mais por um filme rasca americano do que um bom filme doutro país qualquer”, conclui.
Em Contraluz, o realizador passou por uma autêntica aventura, tendo filmado em Los Angeles, nos lagos secos da Califórnia, no deserto de Mojave, no Monument Valley no Utah e ainda no rio Colorado e no lago Mead, no estado do Nevada.
Embora Fernando Fragata considere que ter filmado em Hollywood representa um valor acrescentado para uma eventual exportação daquele que é o seu quarto filme, opina do mesmo modo que “não há espaço” para o cinema nem “português, nem francês, nem italiano, nem espanhol, nem mais nada, a não ser americano.” Na sua perspectiva, “existem muito poucas excepções de filmes não americanos que tiveram sucesso comercial internacional. Mesmo essas excepções nunca chegam a ter sucesso que se equipare ao sucesso de filmes americanos.”
Apesar de tudo, Fernando Fragata afirma que “não existe grande diferença” entre filmar nos EUA e em Portugal. “Mas se há algo que deva frisar são os requisitos legais e o peso burocrático para se filmar nos EUA”, algo de “verdadeiramente aterrador em comparação com Portugal”.
Após a estreia bem-sucedida em território nacional, Contraluz viu recentemente ser lançada uma versão do filme em DVD.
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