domingo, dezembro 28, 2008
:"Talking during a Movie? Say Allo to my Leetle Friend"
quinta-feira, dezembro 25, 2008
:Happy Holiday
quarta-feira, dezembro 10, 2008
:Se me permitem vangloriar...
segunda-feira, dezembro 08, 2008
:Prop 8 - O Musical
:Sea of Love ("Juno")
:Jingle bells, jingle bells...
sábado, novembro 15, 2008
:Indetectável (2008)
terça-feira, novembro 04, 2008
:Because we want change...
segunda-feira, outubro 13, 2008
:La Vita è Bella (1997)
sexta-feira, outubro 10, 2008
:Parabéns!
Ah, e já agora, qual a vossa posição em relação a este assunto?
sábado, setembro 27, 2008
:Grandes Realizadores #1: Gus Van Sant
"I have this new theory about films. It's almost like astrology, where if we started on a Tuesday the film will be different than if we started on a Wednesday. Not because of the planets. It's that sometimes you start with the wrong balance and the whole thing gets messed up."
domingo, setembro 21, 2008
:Revolutionary Movie...?
domingo, setembro 14, 2008
:Mysterious Skin (2004)
“Mysterious Skin – Pele Misteriosa” é, na falta de melhor palavra, assombroso. Estupendo a todos os níveis, devo, antes de tudo, aplaudir veementemente o magnífico desempenho de Joseph Gordon-Levitt que, devo admiti-lo, quase me deixou em lágrimas numa cena extremamente perturbadora. E com isso conseguimos um novo adjectivo para classificar a fita, pois este filme deixar-vos-á transtornados pelo penoso e por vezes sufocante ambiente que assistimos na jornada de Neil.
Gregg Araki traz-nos ao grande ecrã a história de Brady e Neil, duas crianças de oito anos e colegas de uma equipa de basebol que compartilharão uma experiência traumática durante cinco horas; cinco horas que delinearão o percurso das duas personagens indistintamente. Depois de serem os peões sexuais do respectivo treinador, Brady e Neil seguem as suas vidas de uma forma bastante particular e discrepante; Neil torna-se num adolescente homossexual com um comportamento aéreo e indisciplinado, acompanhado pelos dois melhores amigos, e num prostituto cobiçado naquela vila; Brady afigura-se como um jovem retraído e obcecado pela procura da verdade, julgando-se vítima olvidada de um rapto extraterrestre (condicionado, evidentemente, pelo trauma criado com aquele medonho evento). Aliás, é de forma incrível como podemos seguir as vidas dos dois, desde as perigosas e fatídicas aventuras que Neil tinha com Wendy (a imagem daquela criança a chorar e com os foguetes na boca deixou-me abalado) ou como Brady descrevia os seus sonhos com extraterrestres naquele livro. Ambos os actores estão absolutamente de parabéns, há imenso que não via representações tão autênticas.
É, então, nisso que o filme se centra, a pedofilia, a violação e a prostituição como temas primordiais. O argumento está, de facto, notável (adaptação de um romance homónimo de Scott Heim) e a realização, essa, está brilhante. Há planos que me ficaram na mente, desde o inicial onde é possível ver uma chuva de cereais em câmara lenta, a descer para a cabeça feliz de Neil ou o final, um plano picado dos dois adolescentes sob um cântico natalício arrepiante. Daí ganhar dois pontos merecidos e não ver razões para dar menos do que 10 em 10. Assemelha-se, em parte, a Gus Van Sant com “Elephant” e “Paranoid Park”, mas ganha na proficiência da história e da forma como as personagens foram exploradas. Um daqueles raros casos que me afectou e deixou a pensar durante horas e horas, pela profundidade de todas as cenas. É mais do que um filme independente para amantes de dramas perturbadores e violentos, dêem uma oportunidade à película e não se arrependerão. Muito recomendado!
terça-feira, setembro 09, 2008
:Memento (2000)
Leonard Shelby apresenta-se. É um homem que sofre de perda de memória recente desde um terrível incidente, quando ocorreu um assalto em sua casa e violaram e mataram a sua mulher. A partir desse momento, mesmo com a sua incapacidade de criar novas recordações, começa uma infindável busca pela verdade registando todos o que presencia em fotografias e tatuagens pelo seu corpo todo.. "Memento" conta com as magníficas participações de Guy Pearce, Joe Pantoliano e Carrie-Anne Moss (que esteve, a meu ver, brilhante).
Mas é, no entanto, o argumento que resplendece, sobrepujando uma fasquia que se encontra para além do desejável, quer pela sua originalidade como também por uma complexidade extremamente interessante que nos obriga a reflectir sobre cenas anteriormente vistas a fim de compreendermos com maior lucidez o que nos é apresentado. O filme é disposto de uma forma bastante peculiar: começamos por ver o final da fita e, assim, as cenas são organizadas pelo final+começo+começo&final o que valeu a “Memento” a nomeação merecida para o Oscar de melhor montagem. Toda a genialidade reside então nestes dois aspectos, o argumento e a montagem, que prima com uma realização notável. Chistopher Nolan, de "O Cavaleiro das Trevas" (10/10), "Batman Begins" (9/10) e "O Terceiro Passo" (9,5/10), provou mais do que uma vez que veio para fazer história, como um dos mais talentosos realizadores da actualidade. Se tiverem o DVD português aproveitem e vejam a entrevista feita a Nolan. Está, de facto, com este filme que é já dos meus favoritos, de parabéns.
I have to believe in a world outside my own mind. I have to believe that my actions still have meaning, even if I can't remember them. I have to believe that when my eyes are closed, the world's still there. Do I believe the world's still there? Is it still out there?... Yeah. We all need mirrors to remind ourselves who we are. I'm no different.
sexta-feira, setembro 05, 2008
:Milk
segunda-feira, setembro 01, 2008
:Blindness - Premiere Brasileira
Por que foi que cegámos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.Ensaio Sobre a Cegueira, José Saramago
quinta-feira, agosto 21, 2008
:Vicky Cristina Barcelona
quarta-feira, agosto 20, 2008
:Finalmente!
O escritor José Saramago terminou o seu novo livro, "A Viagem do Elefante", que conta a história épica de um elefante asiático chamado Salomão que, no século XVI, teve de percorrer mais de metade da Europa, anunciou hoje a Fundação Saramago.
"Escrevê-lo não foi um passeio ao campo: Saramago lançou-se a esta tarefa quando estava incubando uma doença que tardou meses a deixar-se identificar e que acabou por manifestar-se com uma virulência tal que nos fez temer pela sua vida. Ele próprio, no hospital, chegou a duvidar que pudesse terminar o livro", escreve no blogue da fundação a mulher do escritor, Pilar del Rio.
"Não obstante, sete meses depois, Saramago restabelecido e com novas energias pôs o ponto final numa narração que a ele não lhe parece romance, mas conto, o qual descreve a viagem ao mesmo tempo épica, prosaica e jovial, de um elefante asiático chamado Salomão, que, no século XVI, por alguns caprichos reais e absurdos desígnios teve de percorrer mais de metade da Europa", continua a presidente da Fundação Saramago.
O livro tem cerca de 240 páginas e deverá ser lançado no Outono.
A ideia de escrever este livro tem mais de dez anos e surgiu quando Saramago visitou a Áustria e entrou, em Salzburgo, num restaurante chamado "O Elefante", segundo a Efe, que falou com o escritor através de correio electrónico.
"Escrevi os últimos três livros na mais deplorável situação de saúde, nada propícia a sentimentos de alegria. Prefiro dizer: se tens que escrever, escreverás", disse Saramago, distinguido com o Nobel da Literatura em 1998.
Ainda no comunicado divulgado no blogue da fundação, do qual Pilar é a presidente, a Viagem do Elefante está “pontuado de acordo com as regras de Saramago, os diálogos intercalam-se na narração, um todo que o leitor em de organizar de acordo com a sua própria respiração.” No blogue (http://blog.josesaramago.org) está ainda disponível um fragmento do livro para leitura.
"Não é um livro mais, é o livro que estávamos esperando e que chegou a bom porto, o leitor. Salomão, o elefante, não teve tanta sorte, mas disso não falarei, aguardemos o Outono, e então sim: aí, em vários idiomas simultaneamente, poderemos comentar páginas, aventuras, desenlaces. Os materiais da ficção, que são também os da vida", acrescenta Pilar del Rio sobre a obra.
in Público, 19/08/2008
Mal posso esperar, como é óbvio! Já agora, o filme "Blindness", adaptação do brilhante "Ensaio sobre a Cegueira" estreia dia 13 de Novembro! Esperem post ;)
domingo, julho 13, 2008
O Véu Pintado
A segunda adaptação cinematográfica de “The Painted Veil” (em português, “O Véu Pintado”), história da autoria do francês W. Somerset Maugham, pode ser descrita como uma obra-prima única e intemporal, uma das pérolas do Cinema criadas na última década em que a Arte genuína de fazer filmes se sobrepõe a qualquer interesse financeiro.
Num período em que a indústria se volta cada vez mais para os Blockbusters e para as películas onde a acção – imediata e gratuita – é geralmente a personagem principal, é quase inevitável deduzir que um filme como este estaria longe de ser um êxito de bilheteiras: possuidor de um tom pesado demais para um filme romântico (ou não nos apresentasse logo nos primeiros momentos um casal destroçado e em crise) e excessivamente parado para as massas, estaria à partida condenado ao esquecimento, e os míseros sete milhões arrecadados nos cinemas americanos não são mais que a prova disso.Utilizando com sucesso a técnica “in media res” para nos pôr a par dos conflitos que precederam a viagem de Walter Fane, um bacteriologista eloquente e da sua mulher Kitty, jovem de linhagem abastada, algo ignorante e com ideais românticos, o argumento do filme, escrito por Ron Nyswaner (que também escreveu o aclamado “Philadelphia”), transporta-nos para uma China rural e bucólica (filmada de forma soberba por John Curran) numa trama onde são privilegiados os gestos e as personagens, onde os sentimentos são exteriorizados por subtilezas e onde a atenção ao detalhe é uma constante.
Contrariamente ao que poderíamos esperar, a China aqui não serve apenas como pano de fundo à narrativa – e, no final, ficamos a saber algo mais acerca de uma época em que a China estava em mutação, com promessas de um futuro bastante diferente do cenário visto até ali, e em que a cólera teve efeitos devastadores. A cólera é, aliás, o motivo que leva Walter e a mulher a viajarem até ao vilarejo chinês. O choque entre culturas é igualmente abordado e deixa espaço à reflexão.Edward Norton e Naomi Watts têm aqui interpretações dignas de Oscar - enquanto ele transmite de forma sublime a mágoa de alguém provocada pela traição do cônjuge, ela retrata de forma poderosa a sensação de abandono, desprezo e enclausuramento sentida por Kitty desde o momento em que abandonam Xangai. Quanto aos restantes membros do elenco, estiveram todos muito bem – quer seja Toby Jones, interpretando de forma mais leve a primeira pessoa com quem Kitty cria alguma proximidade na vila ou Diana Rigg, a quem coube o papel de Madre Superiora, que convence, indirectamente, Kitty a iniciar um processo de redenção.
E é esse, possivelmente, o principal tema do filme, a redenção dos erros do passado de Kitty e Walter enquanto casal pelas acções individuais do presente. Todos os pequenos acontecimentos, conversas e actos constituem, assim, cada etapa no penoso percurso de ambas as personagens, que culmina exactamente na aceitação do outro, no perdão mútuo: como Kitty diz em certa cena, It was silly of us to look for qualities in each other that we never had.
“The Painted Veil” é um filme marcante e a sua qualidade está presente em todos os departamentos: quer seja no elenco, com os excelentes Edward Norton e Naomi Watts a interpretar os papéis principais, na realização – a cena do poster é um bom exemplo disso, mas há muitas outras –, no argumento escrito de forma inteligente e cheio de bons diálogos, da autoria de Ron Nyswaner, no cenário, onde a China rural predomina, e na banda sonora, que arrecadou a Alexandre Desplat um Globo de Ouro. Funcionando como um híbrido fenomenal entre os brilhantes “Atonement” (9.5/10) e “The New World” (9.5/10), pelo já mencionado choque entre culturas e pelo ambiente aristocrata de que provêm as personagens, é uma obra extremamente bem filmada sobre as angústias pessoais de duas pessoas. Como qualquer grande história, a sua premissa aparentemente simples atinge gradualmente a complexidade característica da condição humana. E não foram precisas explosões para glorificar a jornada destas duas personagens – apenas a sensibilidade do realizador relativamente aos sentimentos de cada uma.
quarta-feira, julho 09, 2008
Manobras na Casa Branca
segunda-feira, julho 07, 2008
O Incrível Hulk
Antes de começar a crítica propriamente dita ao filme, devo dizer que não vi, por falta de oportunidade (até porque gostei de outros trabalhos do realizador) o filme concebido por Ang Lee em 2003 acerca do Herói verde, pelo que não me poderá ser possível estabelecer qualquer comparação entre os dois. Sei, porque li, que a versão de 2003, com um elenco totalmente diferente daquele visto em “The Incredible Hulk”, era mais voltada para os sentimentos e conflitos entre as personagens principais, e menos centrada nas cenas de acção. Gostava de o ver, verdade seja dita, mas hoje estou cá para falar do Hulk vivido pelo excelente Edward Norton.
Seguindo uma ideologia semelhante àquela que fundamenta (e inicia) a história do Homem-Aranha, encontramos em Hulk alguém que ganhou os seus poderes devido a um incidente, e não por ganância ou ambição, factor indispensável para que se estabeleça uma empatia entre o herói e o espectador. O conflito interior em Bruce Banner, o duelo entre a besta e o ser humano, a contrariedade de sentimentos despoletada pela vontade de se ver livre daquele dom indesejado ao mesmo tempo que se este lhe vai surgindo como um “mal necessário” e, claro, o amor que o une à bela Betty Ross: são esses, essencialmente, os principais ingredientes que compõem a estrutura dramática do filme. Claro que, sem as explosões, não seria a mesma coisa, daí a necessidade de introduzir no baralho o jogo de interesses que levam à perseguição do gigante por parte do General Ross, pai de Betty.As personagens são-nos apresentadas inicialmente enfrentando as consequências que resultaram da experiência em Bruce: enquanto ele se refugiara numa favela brasileira (ver Norton falar português, dizendo coisas como “Não me queira ver com fome”, trocadilho inteligente e compreensível derivado da semelhança entre os vocábulos “angry” e “hungry”) enquanto procurava uma “cura”, Betty cortara relações com o pai e começara uma nova relação com outra pessoa, o General, por sua vez, concentrara-se na procura dele. E tudo assim continuaria, não fosse por um erro que leva a que Bruce seja descoberto.
A partir daí, a intriga amorosa é desenvolvida (confesso que foi algo que me agradou bastante, quer a relação entre Bruce e Betty, quer a relação desta com o pai, captada de forma brilhante quando ela se vê forçada a intervir para tentar salvar o amado numa determinada situação). Aliás, confesso que toda essa situação me lembrou um pouco a história de Cneu Márcio Coriolano: a semelhança entre Cneu e o General, dois traidores – Cneu, do seu povo, o General da confiança da filha –, o desespero da mãe do primeiro que encontra aqui paralelo com o desespero da filha do segundo… Ou se calhar sou eu a ver relações onde elas provavelmente não existem, mas o momento em que Betty se vê forçada a chamar “Pai” a um homem que nem conseguia encarar é poderoso, e a actriz Liv Tyler, que me espantara já na trilogia “Senhor dos Anéis” foi uma excelente escolha para o papel.
Ao mesmo tempo, como não podia deixar de ser, decorrem a perseguição e a procura pela cura, o conflito entre Hulk e um dos soldados, vivido por Tim Roth, que mais tarde se transforma no verdadeiro rival ao gigante verde, tudo criando um bom equilíbrio entre o drama e as cenas de acção que se vão intensificado até ao momento em que passam a ter como pano de fundo a cidade de Nova Iorque.
Contado Ninguém Acredita
Ora aqui está um filme que já queria ver há uns tempos (mas, por preguiça, lá fui adiando a ida ao videoclube)! Não sei porquê, mas a premissa do filme captou-me logo a atenção, lembro-me até de ver umas entrevistas e de ponderar uma ida ao cinema, mas lá ficou esquecido. Pois bem, agora que o vi, posso dizer que é, sem dúvida, um dos meus favoritos.
Marc Forster, que já tinha mostrado talento em “Stay” (um filme que não podia ter visto em pior altura – numa manhã sonolenta de Domingo…), comanda aqui um elenco de luxo encabeçado por Will Ferrell e que conta também com Queen Latifah (que, para mim, constitui sempre uma presença bastante positiva nos filmes em que participa), Maggie Gyllenhaal (a irmã de Jake Gyllenhaal e que poderemos ver brevemente em “The Dark Knight”), a excelente Emma Thompson e o incontornável Dustin Hoffman numa história fora do comum escrita por Zach Helm.Pois bem, essa história é peculiar pois, centrando-se em Harold Crick, o típico americano que trabalha numa empresa (aqui, o IRS) e que leva uma vida mundana (como nos é logo sublinhado pela constante atenção do filme à forma matemática e precisa como ele encara a vida e o seu quotidiano), conta-nos também a história de Karen Eiffel, uma escritora famosa que já não publica um livro há uma década e que é, na verdade, a voz que Harold julga ouvir na sua cabeça e que narra todas as suas acções, como num livro. Ora, desde logo realidade e fantasia se interligam: Karen encontra-se num bloqueio, num dilema, pois não sabe como matar Harold, a personagem principal do seu mais recente livro; Harold, por sua vez, desconhece o facto de que é uma personagem com destino predeterminado por Karen até ao momento em que começa a ouvir a voz dela em todo o lado, uma voz certeira no que diz respeito aos detalhes mais íntimos da personagem. A situação muda ainda mais de figura quando Harold a ouve pressagiar a morte dele, e decide procurar ajuda com o objectivo de inverter a situação.
Soberbamente bem escrito, “Stranger Than Fiction” (em português, “Contado Ninguém Acredita”) funcionou, a meu ver, devido à inteligência e imprevisibilidade do argumento e às várias prestações dos actores: Dustin Hoffman encara aqui de forma divertida um Professor com vastos conhecimentos sobre Literatura e que auxilia Harold na sua jornada, por assim dizer; Maggie Gyllenhaal vive uma pasteleira de convicções fortes e que cria desde logo uma antipatia (justificada) em relação a Harold, mas que, aos poucos, se vai envolvendo com ele; Queen Latifah vive a secretária de Karen Eiffel, e é, juntamente com Emma Thompson, responsável por alguns dos diálogos mais divertidos do filme, fruto do choque de ideias entre as duas personagens; Will Ferrell, por sua vez, interpreta Harold Crick com seriedade, capaz de nos fazer rir sem cair no erro de tornar óbvias as tentativas de comédia.
Se o final é discutível (na minha opinião, tinha de acabar assim, por mais previsível que possa ser, para que o filme resulte, mesmo que o livro fictício de Karen fique, assim, com valor decrescido) quanto à tal imprevisibilidade referida, devo dizer que o resto foi excelente, desde o sofrimento causado a Karen pelo seu bloqueio à mudança de Harold, passando, claro, por aquilo que deve ser o sonho de boa parte dos escritores (não digo “a maioria” para não cair numa generalização precipitada), o de ver uma personagem, uma criação, ganhar vida própria.
Original, irreverente, divertido e com uma mensagem interessante, “Stranger Than Fiction” consegue escapar às armadilhas do género e, embora caia um pouco no melodrama na recta final, não deixa de ser um excelente filme sobre a descoberta da vida, do afecto (a relação entre Harold e Ana Pascal é bem pensada do início ao fim, e a cena em que Harold vai ao apartamento dela é, a meu ver, uma das melhores do filme… arrisco-me quase a dizer que é a melhor, devido à “brincadeira” entre a banda sonora e acção) por uma personagem acomodada à vida mas que se vê, a certa altura, confrontada com a sua morte iminente. Compra obrigatória!
sexta-feira, julho 04, 2008
É preciso pontaria para se casar por amor!
A Igreja cai no ridículo e nem sequer disfarça. Se é assim tão contra o aborto, então porque não deixa este casal casar? É garantido que nunca vão abortar! Deviam aliar-se, hein? Ou então tomemos o exemplo dos homossexuais. Num casamento homossexual é um bocado difícil existir um aborto! A Igreja não devia então apoiar estes casamentos?
Anda tudo trocado, até a suposta fonte de moral se revela a mais imoral de sempre.
Desejo já agora as minhas felicidades ao casal, que mesmo sem festa religiosa organizou uma festa e estão agora juntos pelo amor.
segunda-feira, junho 30, 2008
:“O Sonhador”, Ian McEwan
“Neste livro encontram-se algumas das estranhas aventuras que ocorreram dentro da cabeça de Peter, contadas com todos os pormenores”.
O dia passou-se envolto numa névoa de divertimentos, refeições e sestas. De vez em quando, Peter lembrava-se de que devia ir procurar a varinha, mas logo a seguir os seus pensamentos caíam na armadilha do sabor extraordinário da comida, tão bom que a sua vontade era mergulhar o corpo todo lá dentro; ou então eram apanhados por canções que continham ideias estranhas, que requeriam toda a sua atenção - uma mulher que vivia num sapato, uma vaca que saltava por cima da Lua, um gato que estava num poço; ou, ainda, via qualquer coisa que precisava de meter na boca.
Voltou-se e olhou para o mar. Estava cintilante até o horizonte longínquo. Estendia-se à sua frente, vasto e desconhecido. Uma após outra, as ondas vinham incessantemente desfazer-se na margem, assemelhando-se, na opinião de Peter, a todos as ideias e fantasias que haveria de ter pela vida fora. (…) Para além de todo (…) o movimento humano, o oceano ondulava, revolvia-se e deslizava, pois nada podia permanecer imóvel, nem as pessoas, nem a água, nem o tempo. (…) Começou a correr em direcção à beira-mar. Sentiu-se ágil e leve ao deslizar sobre a areia. «Vou deslocar», pensou. Estaria a sonhar ou a voar?
domingo, junho 22, 2008
:O Banquete de Casamento (1993) - Crítica
“O Banquete de Casamento” (1993), realizado por Ang Lee é, sem sombra de dúvida, um daqueles raros casos que não nos custa reconhecer que irreverente, original, inovador, divertido e tocante são alguns dos muitos adjectivos com que podemos descrever esta película imperdível. Mais do que uma comédia que combina o drama e o romance como subgéneros, o nomeado para o Óscar de melhor filme estrangeiro tem uma forte componente moral e ajuda-nos não só a compreender com mais facilidade outras culturas, mas também a acabar com alguns preconceitos ainda presentes na sociedade actual.
Wai-Tung (Winston Chao) é um bem-sucedido empresário tailandês na área do imobiliário naturalizado na cidade de Nova Iorque e que vive feliz com o seu namorado Simon (Mitchell Lichtenstein). Wai-Tung teria uma vida perfeita se não fosse a mentira que durante mais de vinte anos deu a entender aos seus pais (Sihung Lung como pai e Ah Lei Gua como mãe). Eles desconhecem a condição do filho e estão ansiosos por ver o único filho a dar o nó, dando-lhes, assim, netos. Simon forja, dessa forma, um esquema que beneficiaria não só Wai-Tung e os seus pais, como também uma das suas inquilinas, a artista plástica Wei-Wei (May Chin) que, sendo uma imigrante ilegal, desespera por um visto de residência americano. Todo o plano parece perfeitamente exequível até que os pais de Wai-Tung decidem sair da Ásia e ir de propósito para os Estados Unidos da América assistir ao casamento do filho. Wei-Wei muda-se para a casa de Wai-Tung e Simon que, por sua vez, protagoniza o papel do amigo na farsa. Realiza-se de forma apressada um casamento “à americana” para despachar todo aquele aparato e que desilude em grande escala os pais de Wai-Tung que decidem fazer outro casamento mais convencional que valorizasse as tradições asiáticas e que, após a cerimónia, se sucedesse um grande banquete com trezentos convidados, cortesia do dono do restaurante, amigo do pai do noivo. Tudo isto foi o suficiente para se suceder uma grande confusão, agravada por problemas como a distância relacional que se começa a sentir entre Wai-Tung e Simon, e o entusiasmo de Wei-Wei, que se chega a esquecer que é apenas uma actriz naquela grande encenação.
O rumo que o filme toma, terão de ver depois. Começo por aplaudir todas as interpretações deste fantástico elenco, sobretudo May Chin, que protagoniza a divertida Wei-Wei de uma forma absolutamente genial. Já Winston Chao e Mitchell Lichtenstein estiveram igualmente bem, trazendo até o grande ecrã uma naturalidade e um à-vontade enormes, favorecendo a imagem que se tem sobre as relações entre homossexuais, quase sempre estereotipadas como sendo ou promíscuas ou demasiado perfeitas. Destaco ainda a personagem do pai de Wai-Tung, interpretada por Sihung Lung, que conseguiu de uma forma perfeita representar alguém sábio e muito misterioso, sendo de certa forma o ponto de equilíbrio para a grande desordem presente no filme. Tudo nos actores, todos os diálogos, expressões e acções, nos parece espontâneo, contribuindo para um incrível e genuíno realismo que me impressionou bastante. É, evidentemente, um ponto muito positivo e ajudou para que este filme resultasse.
A história da fita em si é, em poucas palavras, completamente deliciosa. Percebe-se uma grande mestria na construção do argumento e também um grande cuidado em todos os acontecimentos e diálogos, algo que valorizo imenso. Em comparação com a maioria do cinema americano, onde tudo é previsível, repetitivo, irreal e cliché, diria que “Xi Yan” aproxima-se mais do cinema europeu (mais propriamente o francês, espanhol e italiano), onde já não é tomado tão em conta o sucesso que os filmes farão a nível monetário mas sim a sua potencial qualidade artística. Desde a cena em que Wei-Wei tenta, em vão, estrelar dois ovos à cerimónia do primeiro casamento, o espectador consegue perceber que tudo foi pensado, até o mais discreto gesto na primeira vez que se vê o filme nos passa ao lado, obrigando-nos, de certa forma, a revê-lo. De qualquer das formas, não nos é penoso voltar a ver aquelas cenas que nos entretêm. É comédia, sim, mas que utiliza piadas realistas e, ao mesmo tempo, engraçadas, sem serem forçadas (aconselho a todos verem esta cena). Para além disso há, como disse na introdução, os subgéneros, o drama e o romance, que se complementam para tornar este filme um verdadeiramente emocionante. Não serão poucos, certamente, os que se reverão em alguma cena deste “Banquete de Casamento”.
Muitos descrevem este período como o de ouro para Ang Lee, aplaudindo os seus filmes. Creio que todos concordamos que “Hulk” (2003) foi um ponto de viragem negativo para o realizador consagrado pela adaptação da obra de Jane Austen “Sensibilidade e Bom Senso”, que chegou mesmo a temer o futuro da sua carreira por um filme, mas que bem recuperou com o belíssimo “O Segredo de Brokeback Mountain” (2005). Neste filme podemos ver uma boa realização, no entanto, sem nenhum plano memorável sem ser a do final, mas podemos reparar na grande dedicação com que Lee filmou as suas personagens e no esforço com que tentou sempre dinamizar a acção. A cena final está imensamente bem conseguida, traduz-nos um grande sentido de esperança, e resume-nos, de certa maneira, o propósito da fita, com uma a história que tem um lado de inovador e, por conseguinte, polémico. Isto porque o filme já tem quinze anos de existência e os temas abordados – a homossexualidade, a imigração e o choque cultural – são assuntos ainda muito actuais e que continuam a gerar discussão nos dias de hoje. Ajuda-nos a reflectir sobre todas as ideias pré-concebidas presentes dentro de nós, como indivíduos e cidadãos responsáveis, em grande medida, pelas medidas relacionadas com tais questões tomadas a nível político e social lugar onde nos inserimos. É claro que a tolerância é, por assim dizer, o valor central desta película e convém relembrar que deve ser considerada em todos os casos, para que, daqui a alguns anos, não seja preciso, por exemplo, demorar-se vinte anos para se assumir sexualmente.
É um filme que merece ser visto, revisto e saboreado, entretém-nos até o último minuto e faz-nos reflectir sobre importantes assuntos. Simplesmente imperdível e surpreendente.
Nota Final: 9/10
sábado, maio 03, 2008
Pesadelo em Elm Street
One, two, Freddy's coming for you. / Three, four, better lock your door. / Five, six, grab your crucifix. / Seven, eight, better stay awake. / Nine, ten, never sleep again, é engraçado como uma música só pode ajudar a criar uma ambiência mais perturbadora num filme de terror. Algo semelhante foi tentado em “See No Evil” (5.5/10), embora sem os mesmos resultados que neste “A Nightmare On Elm Street”. Esta canção, saída das vozes de crianças, é tocada convenientemente ao longo do filme. E, claro, é importante pois tem uma relação muito forte com o passado de Freddy, como vemos mais à frente.
A história não é nada a que não estejamos habituados. Temos um grupo de adolescentes – entre os quais encontramos o então estreante Johnny Depp e Heather Langenkamp, ambos com interpretações muito ao nível dos slashers, ou seja, muito más – que começam ter sonhos cada vez mais frequentes com uma criatura com garras de metal. Depois de um deles ser morto, começam a levar a coisa mais a sério e apercebem-se de que estão a ser perseguidos por Freddy Krueger, um homem que morrera num incêndio às mãos da população enraivecida, anos antes e que, caso não façam algo, acabarão por morrer.
Algo que me chateou – bastante – foi mesmo a má péssima interpretação de Heather Langenkamp, que, tendo de carregar o filme às costas vivendo uma adolescente filha de pais divorciados que vive com a mãe alcoólica, não consegue em ocasião alguma estar à altura do dramatismo das cenas que protagoniza. Quanto aos restantes, pouco melhores são que ela, mas têm a vantagem de aparecerem muito menos.
Como filme de terror, “A Nightmare On Elm Street” desilude. A banda sonora – excepto aquela canção de que falei no início – não ajuda a criar um ambiente suficientemente assustador e não nos fica nenhuma cena na memória, excepto aquela em que Nancy está na banheira, que, confesso, me fez ficar nervoso enquanto a assistia. De resto, as personagens são – como habitual – burras: reparem, nessa cena, como Nancy se volta a trancar, depois de estar fora de perigo, sujeita a, caso fosse atacada de novo, dificultar a tarefa da mãe em ajudá-la, por exemplo. O confronto final é desperdiçado, na medida em que não consegue gerar uma tensão digna do acontecimento. É tudo muito habitual, portanto.
Contando com um final que nos deixa minimamente intrigados, o filme tem o mérito de nos apresentar uma das personagens mais carismáticas dos filmes de terror – contudo, devo dizer que Freddy me assustou mais no “Freddy Vs Jason” (6/10) do que neste –, de provar que Wes Craven, que o realizou e escreveu, já teve, em tempos, talento para isso, e de nos mostrar a evolução de Johnny Depp como actor ao longo da sua carreira – ganhou de mim um renovado respeito, até. Temos que ter em conta que, na altura do seu lançamento, há 24 anos, o filme terá sido uma pedra no charco, como foi também “Halloween”. Agora, vê-se, simplesmente.
sábado, abril 26, 2008
[REC]
quinta-feira, abril 24, 2008
"Ensaio sobre a Lucidez", José Saramago
Quatro anos se passaram desde o surto de cegueira branca que assolou o país e que fez com que a sua população ficasse, durante semanas, invisual. As pessoas, não tendo encontrado uma explicação para o facto insólito, fizeram como que um pacto de silêncio não formalizado – como vemos na página 175, “Tem razão, pacto em sentido formal não houve, interveio o primeiro-ministro, mas todos pensámos, sem que para isso tivesse sido necessário pôr-nos de acordo e escrevê-lo num papel, que a terrível provação por que havíamos passado deveria, para a saúde do nosso espírito, ser considerada como um pesadelo abominável” – acerca do assunto e continuaram com as suas vidas.
Assolada por um temporal em pleno dia de eleições, a capital vê as suas urnas quase vazias até a meio do dia, quando o tempo começa a melhorar. Contados os votos, a esmagadora maioria – 70% – está em branco e, por isso, convocam-se novas eleições, cujos resultados – ainda mais catastróficos – levam a que o governo lhe declare Estado de Sítio.
A primeira parte do livro é centrada no Ministério em poder, nas suas tácticas e estratégias por si utilizadas face à nova “cegueira”, que desta vez tem a forma de votos brancos. A segunda parte centra-se nas consequências provocadas por uma carta enviada ao governo por um dos protagonistas da prequela.
Contrariamente ao que acontecia com Ensaio Sobre a Cegueira, aqui não encontramos nenhuma personagem que, desde os primeiros desenvolvimentos da narrativa, se perfile como principal. Em vez disso, a obra oferece-nos um enredo que se divide, como já mencionado, em duas partes.
A primeira, referente aos dez capítulos iniciais, essencialmente interessada em mostrar-nos o lado dos políticos, a quem dá o destaque de personagens principais. A segunda, protagonizada por um comissário, um inspector e um agente de segunda classe, e que nos mostra a investigação por eles realizada – após o governo ter recebido uma carta escrita por um dos protagonistas do livro anterior, o primeiro cego, que apontava a mulher do médico como eventual suspeita do surto de votos brancos que assolou as últimas eleições na capital, pelo facto de, há quatro anos, não ter cegado – com o objectivo de averiguar as causas da elevada taxa de votos em branco.
Alguns acontecimentos são protagonizados por uma outra personagem, o presidente da câmara municipal, através de cujos olhos presenciamos o momento da explosão da bomba no metro.
Se, no Ensaio Sobre a Cegueira, existia um enredo que, acompanhando a árdua jornada de um grupo de cegos liderado pela única pessoa a não cegar, nos mostrava a mutação a que o Homem se submetia, a sua perda de identidade, de humanidade, que o levavam a cometer actos de profunda crueldade e barbaridade, mas também de solidariedade e camaradagem, aqui encontramos uma nova intriga e novas reflexões acerca da condição humana.
Nos capítulos dedicados aos políticos, o tema que, na generalidade, os caracteriza, é a corrupção. Corrupção política – através dos discursos preparados para os ministros – e corrupção dos valores – que leva os ministros a cometer decisões hediondas, como a implantação da bomba no metro que resulta em dezenas de vítimas, para ludibriar o país.
Nos capítulos protagonizados pelo presidente da câmara, somos sobretudo levados a reflectir sobre a forma como agimos em relação aos que se encontram à nossa volta, como neste excerto: «É interessante como levamos todos os dias da vida a despedir-nos, dizendo e ouvindo dizer até amanhã e, fatalmente, em um desses dias, o que foi o último para alguém, ou já não está aquele a quem o dissemos, ou já não estamos nós que o tínhamos dito».
Já aqueles em que a acção se centra no comissário e seus subordinados, os temas são a ética – que leva o comissário a recusar-se a criar provas que incriminem, de alguma forma, a mulher do médico – e, novamente, a corrupção – quando o ministro do interior, servindo-se do seu cargo superior em relação ao comissário, procura a todo o custo provar a culpabilidade de um inocente.
Concluindo, os temas que predominam neste livro são a corrupção, a ética e os valores humanos. No primeiro, chocavam-nos as descrições terrivelmente realistas dos actos cometidos pelas personagens, bem como dos ambientes, cada vez mais degradados, que as rodeavam; aqui, choca-nos a frieza com que um ministro ordena a implantação de um dispositivo que causará a morte de dezenas de cidadãos e, horas depois, atribui a culpa aos supostos inimigos, os cabecilhas dos brancosos, ou a forma como um homem denuncia uma mulher – por um crime que ela nem cometera –, a quem, anos antes, devera a sobrevivência.
Mas será “Ensaio Sobre a Lucidez” uma sequela no verdadeiro sentido da palavra? As possíveis respostas a esta questão são várias e, claro, dependentes de cada leitor.
Alguns dirão que não, dado que nos primeiros dez capítulos não encontramos mais que menções – na maior parte das vezes, vagas – aos acontecimentos narrados em Ensaio Sobre a Cegueira e que, por esse motivo, boa parte do livro tem poucas relações – evidentes – com o enredo do anterior.
Outros, contudo, responderão que sim, que o livro é uma continuação pois, apesar de na primeira dezena de capítulos a acção não continuar seguindo as mesmas personagens da prequela, a verdade é que estas voltam e que, mesmo sob a forma de personagens secundárias, têm, a certa altura, um grande impacto nos acontecimentos, como de resto nos é anunciado pelo narrador – «Se esta discussão não tivesse acontecido, se o manifesto presidencial e os papéis volantes tivessem, por desnecessários, terminado no livro a sua breve vida, a história que estamos a contar seria, daqui para diante, bastante diferente». Além disso, a sua ausência é compensada pelos interrogatórios, que nos proporcionam informações sobre o que se passou com elas ao longo dos quatro anos que se passaram, bem como sobre o presente.
Assim, podemos concluir que Ensaio Sobre a Lucidez, apesar de centrar a acção noutras personagens, não negligencia as que protagonizaram o romance antecedente, nem tampouco o seu enredo; dá-lhes, aliás, continuação.
Falando agora da escrita, nesta obra encontramos características que tornam as criações de Saramago algo, pode dizer-se, singular.
Com isto falo, claro, das frases – por vezes, excessivamente – longas, que negligenciam regularmente as regras de pontuação; as reflexões acerca da condição humana e do Homem, muitas vezes conotadas com um certo sarcasmo também típico de Saramago; os diálogos cujas falas se apresentam intercaladas por vírgulas, violando, por isso, o sistema que predomina na maioria dos romances.
De notar que esta última característica, o facto de as falas das personagens estarem separadas por uma simples vírgula, é decisiva para a construção dos diálogos, que desta forma beneficiam de uma maior fluidez, como vemos no seguinte exemplo: «Olho para si e não lhe vejo cara de assassina, Não sou uma assassina, Matou um homem, Não era um homem, senhor comissário, era um percevejo».
Os motivos que me levaram a gostar bastante deste livro prendem-se, sobretudo, à escrita do autor – que, ao contrário de muitos, é um valioso suporte à narrativa –, às reflexões acerca do ser, do Homem, à história em si, que nos mostra uma capital abandonada pelos governantes, um Ministério reinado por corruptos e um grupo de personagens de convicções fortes por quem acabamos por torcer, mais cedo ou mais tarde.
Apesar disso, não posso deixar de apontar dois aspectos negativos. O primeiro relaciona-se com o facto de não nos ser dada nenhuma explicação para as causas da cegueira branca do anterior, nem acerca dos votos em branco. O segundo, que impede que Ensaio Sobre a Lucidez ascenda ao brilhantismo de Ensaio Sobre a Cegueira, é o facto de, como grande parte do livro é centrada em políticos e nas reuniões entre si e de, depois, sermos apresentados a outros protagonistas – personagens completamente novas à história –, o livro não provoca no leitor o mesmo envolvimento com a história e as personagens, algo que era atingido com mestria no anterior.
É, contudo, um óptimo livro, que em muito supera as leituras a que as massas comodamente se habituam e que, pessoalmente, recomendaria a todos os que gostaram do Ensaio Sobre a Cegueira.
segunda-feira, abril 14, 2008
Hostel
Neste post, farei uma crítica a um filme que revi este fim-de-semana e que foi bastante falado aquando da sua saída, Hostel.
Hostel estreou nos E.U.A. em 2005 e aqui em Portugal em Abril de 2006 – precisamente quando eu o vi pela primeira vez. Antes da sua estreia por terras americanas, o filme causou grande impacto nos festivais em que foi exibido, tendo levado alguns críticos a afirmar que se tratava do filme mais assustador de sempre e que era extremamente violento (existem relatos até de pessoas que não aguentaram até ao fim do filme). Criou-se, então, um enorme hype à volta do filme e todos estavam ansiosos por vê-lo. Será que aquilo que diziam era verdade? Continuem e a ler e descobrirão…
A trama do filme começa por nos apresentar às três personagens principais, dois americanos (Paxton e Josh) e um islandês (Oli), que se encontram em Amsterdão, o penúltimo destino da viagem pela Europa. Apesar de tencionarem ir para Espanha em seguida, um habitante local indica-lhes um sítio onde eles podem satisfazer todas as suas fantasias sexuais, um albergue situado em Bratislava, na Eslováquia. Persuadidos por aquilo que ele lhes dissera e pelas fotografias das mulheres que poderiam lá encontrar, os três partem para Bratislava. Lá, encontram duas mulheres (Natalya e Svetlana) com quem começam a criar uma afinidade, não sabendo o terror que os aguarda.
A primeira parte do filme ocupa-se de desenvolver as personagens, apesar de o fazer apenas superficialmente. Um deles é viciado em sexo e, aos oito anos, viu uma rapariga afogar-se, outro intitula-se como o “rei do swing” e a nossa personagem principal é o mais recatado do trio e o mais responsável. De início, devo dizer que as personagens não criam grande empatia com o espectador mas isso vai mudando à medida que a história desenvolve. A segunda parte do filme muda drasticamente de tom e mergulha as personagens principais num terror que nunca poderiam prever, apresentando-nos um lugar onde cada um pode matar, torturar e satisfazer as suas fantasias mais selvagens por um preço. Como podem imaginar, o destino do trio não é nada admirador.
O ponto central da história é mesmo esse lugar e a forma como as coisas funcionam por lá – e isto é, segundo o realizador Eli Roth, baseado em factos reais. Encontramos então um grupo de vilões ricos de várias nacionalidades dispostos a tratar as suas vítimas de forma digamos… não muito agradável. As cenas de tortura variam de intensidade – aquela em que cortam os tendões do calcanhar a uma personagem é a melhor e a mais perturbante de todas. Quanto ao gore, é em grande quantidade e capaz de fazer alguns desviar os olhos em algumas cenas.
sexta-feira, abril 11, 2008
:U2 3D (2007) - Crítica
Como já disse, “U2 3D” começou com “Vertigo”, o que foi uma óptima escolha e deu perfeitamente para reconhecer toda os efeitos digitais que podiam impressionar o espectador. Na primeira meia hora fiquei bastante surpreendido com a tecnologia mas, quando me habituei, pude concentrar-me mais nas músicas que foram tocadas e devo dizer que achei algumas um pouco irritantes e foram desnecessariamente colocadas como, por exemplo “The Fly” ou “Pride”… não sei é mesmo por não apreciar maioriotariamente tanto as versões “live” às do estúdio ou se, realmente, estavam fracamente tocadas, porque a única coisa que me vinha aos pensamentos era que mal podia esperar pela próxima música.Gostei da “Love and Peace or Else” e a “Sunday Bloody Sunday”, apesar de não inspirar tanta força e sentimento como a original, fez-me recordar o meu ano passado, com alguma nostalgia. Retomando, as outras melodias não me atraem e podiam ser facilmente substituidas com êxitos como “Elevation” ou “City Of Blinding Lights”, que são agradáveis e fazem-me vibrar!
Ainda assim, e apesar disto e alguns planos que podiam ser cortados, agradou-me todo o espectáculo, pesar de não ser apologista de ter em cartaz concertos musicais. Para isso, na minha opinião, criavam-se espaços próprios, não misturando com filmes de ficção e documentários (sublinho também o sentido da palavra “documentário”, género que surge, do nada, no IMDB) para quem não queria ou podia ver a banda preferida ao vivo. A recta final foi bastante boa, com a passagem da declaração universal dos direitos do Homem, e com as palavras a sairem do grande ecrã.
Passei, no final de tudo e fazendo o balanço, um óptimo serão ao lado dos meus melhores amigos, apesar de algumas performances pudessem estar melhor, algumas músicas pudessem ser substituidas, e alguns planos pudessem ser reconsiderados. Repito: apesar de ter gostado de “U2 3D”, nada de concertos nas salas de cinema!
Nota: 8/10
segunda-feira, março 24, 2008
Aquilo que somos
No conto, encontramos um velho num café a relatar-nos a história da sua vida. Ele fala-nos dos amigos que antes lhe faziam companhia naquelas tardes passadas a beber café e sobre a perda do amor da sua vida, bem como doutras coisas. Achei este relato deprimente e com significado. Em primeiro lugar, porque é sobre uma vida falhada, sobre uma vida mal vivida e aproveitada.
Todos dizemos que devemos é gozar a vida, vivê-la intensamente, mas poucos o conseguem fazer. Todos ouvimos dizer que o tempo passa depressa e não poupa ninguém, mas só nos apercebemos disso quando já é tarde. Todos temos a noção de que, mais cedo ou mais tarde, ficaremos sozinhos, desamparados, mas vivemos na ilusão de que isso é mentira. Todos temos receio de envelhecer, apesar de isso ser uma coisa natural; afinal de contas, faz parte do ciclo da vida.
“A vida de um idoso é recordar o seu passado; se tem boas recordações, é feliz, se teve uma vida má, não é.”, dissera o pai de uma amiga minha, há mais ou menos dois meses, quando jantávamos. No conto, o narrador é uma pessoa que pertence, claramente, ao segundo grupo. Ele vive refugiado nas lembranças, no pensamento, isolado em si mesmo. Mas… e se esse eu me tornar nesse velho?
Já imaginaram o que deve ser chegarmos ao fim da linha e apercebermo-nos de que falhámos, de que devíamos ter feito as coisas de maneira bem diferente e de que não temos mais oportunidades? De que estamos sozinhos porque não fomos mais ousados? De que não temos bons momentos a recordar? De que vamos morrer no esquecimento, sem ninguém para sentir a nossa falta? De que, no fundo, a nossa existência foi quase… em vão? Pois, eu tenho vindo a pensar nisso… e acho que deve ser terrivelmente penoso chegarmos a essas conclusões na fase final das nossas vidas.
Perdidos pelos parques, sentados nos cafés… todos nós já encontrámos idosos assim, quase vegetativos, a pensar na vida. Já imaginaram como deve ser viver assim, sem perspectivas de vida, sem motivos de felicidade? Eu já. E, sinceramente, não gostei de me pôr no lugar deles.
Por isso, acho que devíamos realmente reflectir sobre dois aspectos:
Se queremos tornar-nos naquelas pessoas e se é correcto existirem pessoas abandonadas nos lares pelos seus familiares.
Pensem e tirem as vosssas conclusões, porque eu já tirei as minhas…
Citação do dia:
Georgia Byrd: Next time… we will laugh more, we’ll love more; we just won’t be so afraid.
Do filme Tudo o que sempre Sonhei (Last Holiday), que vi há uma semana e gostei muito. E, como tem muito a ver com a temática do post, acho que a citação se enquadra perfeitamente. Aconselho a verem!
sábado, março 22, 2008
Mais uma contradição
quinta-feira, março 20, 2008
"A criança que não queria falar", Torey Hayden
A partir daqui começa o desenrolar da história. Sheila é proposta a um hospital psiquiátrico, mas não há vagas. A única solução que parece aceitável é uma escola especializada, solução esta que foi aceite. De início pareceu complicado, pois a professora para onde foi enviada, Torey, já tinha o número máximo de alunos na sua turma. Mas, como o caso era urgente, a professora teve de ficar com nove crianças.
Começou tudo como previsto: mal. Sheila não se adaptava (também, penso que é normal uma criança com esta vida não se adaptar) e assustou ainda mais as outras crianças. Imensos episódios trágicos aconteceram e fizeram Torey aperceber-se de que tinha algo muito grande em mãos, que teria de dedicar todas as suas forças para ajudar esta criança. Foi então que laços muito fortes entre as duas começaram a existir e a crescer, dia após dia. Aquela escola passou do pior pesadelo à única coisa boa que aquela criança tinha. Todos os dias se dirigia para lá feliz por ir e vinha embora feliz por lá ter estado. Sheila começava a aprender o significado da palavra tão usada hoje em dia, mas tão pouco vista em prática: a felicidade.
quarta-feira, março 19, 2008
Para Sempre, Talvez...
O primeiro aspecto positivo que devo salientar é o teor da relação entre William e a sua filha, Maya, interpretada por Abigail Breslin (e que, como sabemos, foi nomeada para um Óscar devido à sua performance no filme "Little Miss Sunshine"), que revela uma química engraçada entre os dois e nos proporciona diálogos muitas vezes hilariantes (tomem o exemplo da cena em que ela lhe pergunta o que é uma ménage à trois). Sim senhor, parabéns aos dois. Depois, talvez aquele que será o melhor detalhe é a forma como a narrativa nos é apresentada - que nos leva a, ao mesmo tempo que Maya, tentar adivinhar quem será, das três, a sua mãe - e que, devido à sua imprevisibilidade, nos prende desde o começo e nos continua a cativar até ao fim. Esta foi uma escolha feliz e eficaz por parte de Adam Brooks, realizador e autor do argumento, que aqui atingiu também melhores resultados que na má sequela de "Bridget Jone's Diary".
Quanto às actrizes que vivem os três interesses românticos da personagem principal ao logo da história, estão todas de parabéns. Rachel Weisz, sempre fenomenal, volta aqui a dar uma excelente interpretação vestindo a pele de Summer, uma escritora que, no início, se encontra numa relação com um sexagenário; Isla Fisher, que entrou no engraçado "Wedding Crashers", vive aqui April, a personagem com quem acabamos por criar mais empatia e com quem William forma uma amizade desde a sua chegada à cidade; Elizabeth Banks, por fim, é Emily, a tal namorada que fica à espera dele no Winsconsin. O argumento trata sempre de as trazer de alguma forma à história, mesmo quando pensávamos que não as veríamos mais e se, a dada altura pensarem, como eu, já ter descoberto tudo, o mais provável é que, nos minutos seguintes, o filme vos prove que estão enganados.
Já em relação a Ryan Reynolds, volta aqui a estar muito bem vestindo a pele de um homem simples com, apesar do que possa parecer, muito azar no campo amoroso da sua vida e por quem acabamos por torcer. Por fim, Adam Brooks não faz um trabalho excepcional na realização: em vez disso, aposta por conduzir a narrativa de forma discreta, por assim dizer, o que, apesar de não ser sinal de uma obra-prima, também não demonstra falta de qualidade. A sua posta - ganha - vai, claramente, para o argumento, ao qual já teci os devidos elogios e do qual apenas tenho uma coisa negativa a apontar - o final. Não que seja mau, ou sem graça, porque não é; a última cena é que é um pouco previsível.
O filme pode até nem inovar em muitos aspectos, nem tampouco parece ser o seu objectivo; é, sim, uma história reconfortante que, seguindo uma fórmula diferente da habitual, nos prende e nos leva a querer saber como tudo aquilo vai acabar. Destaca-se, também, por, contrariamente à maioria dos filmes deste género, centrar a sua acção num homem e não numa mulher, o que é sempre bom para o público masculino, que, geralmente, não é grande fã destes filmes. Engraçado e enternecedor, "Definitely, Maybe" é um dos bons filmes deste primeiro trimestre de 2008 e só é pena ter tido uma tradução para Português tão má como "Para Sempre. Talvez...". Aconselho, sem dúvida!