“Mysterious Skin – Pele Misteriosa” é, na falta de melhor palavra, assombroso. Estupendo a todos os níveis, devo, antes de tudo, aplaudir veementemente o magnífico desempenho de Joseph Gordon-Levitt que, devo admiti-lo, quase me deixou em lágrimas numa cena extremamente perturbadora. E com isso conseguimos um novo adjectivo para classificar a fita, pois este filme deixar-vos-á transtornados pelo penoso e por vezes sufocante ambiente que assistimos na jornada de Neil.
Gregg Araki traz-nos ao grande ecrã a história de Brady e Neil, duas crianças de oito anos e colegas de uma equipa de basebol que compartilharão uma experiência traumática durante cinco horas; cinco horas que delinearão o percurso das duas personagens indistintamente. Depois de serem os peões sexuais do respectivo treinador, Brady e Neil seguem as suas vidas de uma forma bastante particular e discrepante; Neil torna-se num adolescente homossexual com um comportamento aéreo e indisciplinado, acompanhado pelos dois melhores amigos, e num prostituto cobiçado naquela vila; Brady afigura-se como um jovem retraído e obcecado pela procura da verdade, julgando-se vítima olvidada de um rapto extraterrestre (condicionado, evidentemente, pelo trauma criado com aquele medonho evento). Aliás, é de forma incrível como podemos seguir as vidas dos dois, desde as perigosas e fatídicas aventuras que Neil tinha com Wendy (a imagem daquela criança a chorar e com os foguetes na boca deixou-me abalado) ou como Brady descrevia os seus sonhos com extraterrestres naquele livro. Ambos os actores estão absolutamente de parabéns, há imenso que não via representações tão autênticas.
É, então, nisso que o filme se centra, a pedofilia, a violação e a prostituição como temas primordiais. O argumento está, de facto, notável (adaptação de um romance homónimo de Scott Heim) e a realização, essa, está brilhante. Há planos que me ficaram na mente, desde o inicial onde é possível ver uma chuva de cereais em câmara lenta, a descer para a cabeça feliz de Neil ou o final, um plano picado dos dois adolescentes sob um cântico natalício arrepiante. Daí ganhar dois pontos merecidos e não ver razões para dar menos do que 10 em 10. Assemelha-se, em parte, a Gus Van Sant com “Elephant” e “Paranoid Park”, mas ganha na proficiência da história e da forma como as personagens foram exploradas. Um daqueles raros casos que me afectou e deixou a pensar durante horas e horas, pela profundidade de todas as cenas. É mais do que um filme independente para amantes de dramas perturbadores e violentos, dêem uma oportunidade à película e não se arrependerão. Muito recomendado!
9/10