Será assim tão necessário começar por descrever a febre que afunda este filme? Custa-me, apesar de todas as minhas anteriores convicções, admitir que sim porque, desde a sua chegada, o que se tem dito da nova película do “titânico” Cameron, consensualmente e no frenético meio que é a Internet, viaja entre “absolutamente revolucionário” a “um novo marco na História do Cinema”. Após a visualização do mesmo, fico em dúvida se se referiam ao filme em si ou ao marketing que o abraçou - porque este, louvado seja tamanho orçamento investido em tempo de crise, esteve presente como nunca antes vimos num filme. Portanto, e para terminar este assunto (tentei mesmo não iniciar uma opinião por este ponto mas…!), apelo a todos que julguem uma película como estas (e como qualquer outra, aliás) de forma independente, ponderada e lúcida.
Continuando na linha do marketing, devo dizer que era, já, por demais expectável o que poderia sair com este “Avatar”. Puro entretenimento para as massas, animação digital trabalhada com a mestria que os 237 milhões de dólares exigiam da equipa técnica (será que é desta que a Academia decide nomeá-lo para o Óscar de melhor filme de animação?), um argumento rápido e convincente para (quase) todos os espectadores. O que não se esperava, pessoalmente: um resultado tão belo e crível do mundo natural de Pandora (terá sido assim tão preciso sair dos confins da Terra, que cineastas como Malick captam de forma inigualável, para maravilhar um espectador humano?) e as referências retiradas de diversas outras obras do cinema e da literatura de uma forma gritantemente pretensiosa, fingindo uma artificial inovação em termos narrativos que ilude, facilmente, o mais ingénuo e deslumbrado espectador. Não é por menos: o 3D (ainda que me proporcionando uma indesejada dor de cabeça) funciona como nunca outro filme o conseguiu, trazendo a tudo um relevo impressionante (pelo menos na primeira meia hora). Nesse aspecto, e há que admiti-lo, espera-se nos próximos tempos uma utilização desta ferramenta mais frequente e competente (mas, por favor, 2D, não fujas de nós!). Pandora é um “novo mundo” (reforcem-se as aspas) repleto de criaturas que, muito convenientemente, na fase final da película, se unem à lá filmes da Disney para combater o inimigo comum, que é o homem. As cenas de acção resultam muito bem, principalmente na última meia hora da película. Este planeta tem, também, o seu quê de fantástico e místico que, de forma muito objectiva, é evidenciado pelas interligações que os indígenas estabelecem com toda a Natureza — uma mensagem ambientalista, espiritual, quase religiosa, que bem poderia funcionar não fosse, mais uma vez, a tentativa de parecer introdutora e criada com magnificência. Também a cultura dos Na’vi evidencia um obtuso etnocentrismo que Cameron não evitou seguir — todos eles têm características humanas e não há nada de “alien” neles, por assim dizer, são índios gigantes pintados de azul. Para finalizar o leque de lugares-comuns presente na estrutura clássica hollywoodesca do guião (há muitos mais, não vou é agora aborrecer-me a enumerá-los), John Smith conhece, também, a sua Pocahontas, relacionando-se com ela de forma incoerente e enveredando pela química humana e tradicional com que já se esperava. A fórmula de entreter e maravilhar o senso comum atingiu-se neste filme.
Pondo de parte a banda-sonora, que nada traz de novo senão uma leve impaciência e familiaridade, e pondo, também, de parte, o tema musical com que somos presenteados no final do filme (não, Cameron, “Avatar” não é o “Titanic”!), há que assinalar, por fim, a miséria geral das interpretações (com personagens tão mal construídas quanto estas, sobretudo a encarnada por Stephen Lang, não se esperava mais).
Em suma: uma técnica geral perfeita, que consegue fazer-nos suportar a duração extensa do filme, aliada a um argumento pobre e repleto de clichés, e uma experiência sensitiva apenas interessante.
6/10
[re-apreciação feita no dia 20/01/2010]
[re-apreciação feita no dia 20/01/2010]