domingo, julho 13, 2008

O Véu Pintado


A segunda adaptação cinematográfica de “The Painted Veil” (em português, “O Véu Pintado”), história da autoria do francês W. Somerset Maugham, pode ser descrita como uma obra-prima única e intemporal, uma das pérolas do Cinema criadas na última década em que a Arte genuína de fazer filmes se sobrepõe a qualquer interesse financeiro.

Num período em que a indústria se volta cada vez mais para os Blockbusters e para as películas onde a acção – imediata e gratuita – é geralmente a personagem principal, é quase inevitável deduzir que um filme como este estaria longe de ser um êxito de bilheteiras: possuidor de um tom pesado demais para um filme romântico (ou não nos apresentasse logo nos primeiros momentos um casal destroçado e em crise) e excessivamente parado para as massas, estaria à partida condenado ao esquecimento, e os míseros sete milhões arrecadados nos cinemas americanos não são mais que a prova disso.

Utilizando com sucesso a técnica “in media res” para nos pôr a par dos conflitos que precederam a viagem de Walter Fane, um bacteriologista eloquente e da sua mulher Kitty, jovem de linhagem abastada, algo ignorante e com ideais românticos, o argumento do filme, escrito por Ron Nyswaner (que também escreveu o aclamado “Philadelphia”), transporta-nos para uma China rural e bucólica (filmada de forma soberba por John Curran) numa trama onde são privilegiados os gestos e as personagens, onde os sentimentos são exteriorizados por subtilezas e onde a atenção ao detalhe é uma constante.

Contrariamente ao que poderíamos esperar, a China aqui não serve apenas como pano de fundo à narrativa – e, no final, ficamos a saber algo mais acerca de uma época em que a China estava em mutação, com promessas de um futuro bastante diferente do cenário visto até ali, e em que a cólera teve efeitos devastadores. A cólera é, aliás, o motivo que leva Walter e a mulher a viajarem até ao vilarejo chinês. O choque entre culturas é igualmente abordado e deixa espaço à reflexão.

Edward Norton e Naomi Watts têm aqui interpretações dignas de Oscar - enquanto ele transmite de forma sublime a mágoa de alguém provocada pela traição do cônjuge, ela retrata de forma poderosa a sensação de abandono, desprezo e enclausuramento sentida por Kitty desde o momento em que abandonam Xangai. Quanto aos restantes membros do elenco, estiveram todos muito bem – quer seja Toby Jones, interpretando de forma mais leve a primeira pessoa com quem Kitty cria alguma proximidade na vila ou Diana Rigg, a quem coube o papel de Madre Superiora, que convence, indirectamente, Kitty a iniciar um processo de redenção.


E é esse, possivelmente, o principal tema do filme, a redenção dos erros do passado de Kitty e Walter enquanto casal pelas acções individuais do presente. Todos os pequenos acontecimentos, conversas e actos constituem, assim, cada etapa no penoso percurso de ambas as personagens, que culmina exactamente na aceitação do outro, no perdão mútuo: como Kitty diz em certa cena, It was silly of us to look for qualities in each other that we never had.




“The Painted Veil” é um filme marcante e a sua qualidade está presente em todos os departamentos: quer seja no elenco, com os excelentes Edward Norton e Naomi Watts a interpretar os papéis principais, na realização – a cena do poster é um bom exemplo disso, mas há muitas outras –, no argumento escrito de forma inteligente e cheio de bons diálogos, da autoria de Ron Nyswaner, no cenário, onde a China rural predomina, e na banda sonora, que arrecadou a Alexandre Desplat um Globo de Ouro. Funcionando como um híbrido fenomenal entre os brilhantes “Atonement” (9.5/10) e “The New World” (9.5/10), pelo já mencionado choque entre culturas e pelo ambiente aristocrata de que provêm as personagens, é uma obra extremamente bem filmada sobre as angústias pessoais de duas pessoas. Como qualquer grande história, a sua premissa aparentemente simples atinge gradualmente a complexidade característica da condição humana. E não foram precisas explosões para glorificar a jornada destas duas personagens – apenas a sensibilidade do realizador relativamente aos sentimentos de cada uma.

quarta-feira, julho 09, 2008

Manobras na Casa Branca

Já todos sabemos que por trás de um grande político está sempre uma boa campanha. O que nem toda a gente sabe é que nem sempre é por seu mérito próprio, que há pessoas que por vezes fazem o seu trabalho. Neste filme, “Manobras na Casa Branca” (com o título original “Wag the Dog”) podemos ver o que está por trás de uma campanha de um presidente que, dez dias antes das eleições foi acusado de abusos sexuais. Começamos logo por ler uma metáfora ao filme, “O cão é mais inteligente do que o rabo porque senão era o rabo a abanar o cão”. Porque é que isto é uma metáfora? Descubram.

segunda-feira, julho 07, 2008

O Incrível Hulk


Antes de começar a crítica propriamente dita ao filme, devo dizer que não vi, por falta de oportunidade (até porque gostei de outros trabalhos do realizador) o filme concebido por Ang Lee em 2003 acerca do Herói verde, pelo que não me poderá ser possível estabelecer qualquer comparação entre os dois. Sei, porque li, que a versão de 2003, com um elenco totalmente diferente daquele visto em “The Incredible Hulk”, era mais voltada para os sentimentos e conflitos entre as personagens principais, e menos centrada nas cenas de acção. Gostava de o ver, verdade seja dita, mas hoje estou cá para falar do Hulk vivido pelo excelente Edward Norton.

Seguindo uma ideologia semelhante àquela que fundamenta (e inicia) a história do Homem-Aranha, encontramos em Hulk alguém que ganhou os seus poderes devido a um incidente, e não por ganância ou ambição, factor indispensável para que se estabeleça uma empatia entre o herói e o espectador. O conflito interior em Bruce Banner, o duelo entre a besta e o ser humano, a contrariedade de sentimentos despoletada pela vontade de se ver livre daquele dom indesejado ao mesmo tempo que se este lhe vai surgindo como um “mal necessário” e, claro, o amor que o une à bela Betty Ross: são esses, essencialmente, os principais ingredientes que compõem a estrutura dramática do filme. Claro que, sem as explosões, não seria a mesma coisa, daí a necessidade de introduzir no baralho o jogo de interesses que levam à perseguição do gigante por parte do General Ross, pai de Betty.

As personagens são-nos apresentadas inicialmente enfrentando as consequências que resultaram da experiência em Bruce: enquanto ele se refugiara numa favela brasileira (ver Norton falar português, dizendo coisas como “Não me queira ver com fome”, trocadilho inteligente e compreensível derivado da semelhança entre os vocábulos “angry” e “hungry”) enquanto procurava uma “cura”, Betty cortara relações com o pai e começara uma nova relação com outra pessoa, o General, por sua vez, concentrara-se na procura dele. E tudo assim continuaria, não fosse por um erro que leva a que Bruce seja descoberto.

A partir daí, a intriga amorosa é desenvolvida (confesso que foi algo que me agradou bastante, quer a relação entre Bruce e Betty, quer a relação desta com o pai, captada de forma brilhante quando ela se vê forçada a intervir para tentar salvar o amado numa determinada situação). Aliás, confesso que toda essa situação me lembrou um pouco a história de Cneu Márcio Coriolano: a semelhança entre Cneu e o General, dois traidores – Cneu, do seu povo, o General da confiança da filha –, o desespero da mãe do primeiro que encontra aqui paralelo com o desespero da filha do segundo… Ou se calhar sou eu a ver relações onde elas provavelmente não existem, mas o momento em que Betty se vê forçada a chamar “Pai” a um homem que nem conseguia encarar é poderoso, e a actriz Liv Tyler, que me espantara já na trilogia “Senhor dos Anéis” foi uma excelente escolha para o papel.

Ao mesmo tempo, como não podia deixar de ser, decorrem a perseguição e a procura pela cura, o conflito entre Hulk e um dos soldados, vivido por Tim Roth, que mais tarde se transforma no verdadeiro rival ao gigante verde, tudo criando um bom equilíbrio entre o drama e as cenas de acção que se vão intensificado até ao momento em que passam a ter como pano de fundo a cidade de Nova Iorque.

E é esse equilíbrio que faz de “The Incredible Hulk” um melhor filme que o “Iron Man” (6.5/10), a meu ver: aqui as cenas de acção são genuinamente emocionantes (a cena em que Bruce se lança de um helicópetro, mesmo sem certezas sobre se se irá transformar ou não é um bom exemplo disso), o conflito interior da personagem é melhor abordado e as cenas de romance existem em número suficiente sem caírem na lamechice vista em “Spiderman 3”. No final, não deixa de ser mais um filme dito “popcorn”… é leve, sim, e não exige muito do seu espectador – sabemos desde o início quem são os bons e os maus, por exemplo –, mas é um excelente filme de Super-Heróis, e, na minha opinião, o melhor, logo a seguir a “Spiderman 2” (9/10). Espero sinceramente que façam sequela porque, se sim, não vou esperar quatro semanas para a ver…

Contado Ninguém Acredita


Ora aqui está um filme que já queria ver há uns tempos (mas, por preguiça, lá fui adiando a ida ao videoclube)! Não sei porquê, mas a premissa do filme captou-me logo a atenção, lembro-me até de ver umas entrevistas e de ponderar uma ida ao cinema, mas lá ficou esquecido. Pois bem, agora que o vi, posso dizer que é, sem dúvida, um dos meus favoritos.

Marc Forster, que já tinha mostrado talento em “Stay” (um filme que não podia ter visto em pior altura – numa manhã sonolenta de Domingo…), comanda aqui um elenco de luxo encabeçado por Will Ferrell e que conta também com Queen Latifah (que, para mim, constitui sempre uma presença bastante positiva nos filmes em que participa), Maggie Gyllenhaal (a irmã de Jake Gyllenhaal e que poderemos ver brevemente em “The Dark Knight”), a excelente Emma Thompson e o incontornável Dustin Hoffman numa história fora do comum escrita por Zach Helm.

Pois bem, essa história é peculiar pois, centrando-se em Harold Crick, o típico americano que trabalha numa empresa (aqui, o IRS) e que leva uma vida mundana (como nos é logo sublinhado pela constante atenção do filme à forma matemática e precisa como ele encara a vida e o seu quotidiano), conta-nos também a história de Karen Eiffel, uma escritora famosa que já não publica um livro há uma década e que é, na verdade, a voz que Harold julga ouvir na sua cabeça e que narra todas as suas acções, como num livro. Ora, desde logo realidade e fantasia se interligam: Karen encontra-se num bloqueio, num dilema, pois não sabe como matar Harold, a personagem principal do seu mais recente livro; Harold, por sua vez, desconhece o facto de que é uma personagem com destino predeterminado por Karen até ao momento em que começa a ouvir a voz dela em todo o lado, uma voz certeira no que diz respeito aos detalhes mais íntimos da personagem. A situação muda ainda mais de figura quando Harold a ouve pressagiar a morte dele, e decide procurar ajuda com o objectivo de inverter a situação.

Soberbamente bem escrito, “Stranger Than Fiction” (em português, “Contado Ninguém Acredita”) funcionou, a meu ver, devido à inteligência e imprevisibilidade do argumento e às várias prestações dos actores: Dustin Hoffman encara aqui de forma divertida um Professor com vastos conhecimentos sobre Literatura e que auxilia Harold na sua jornada, por assim dizer; Maggie Gyllenhaal vive uma pasteleira de convicções fortes e que cria desde logo uma antipatia (justificada) em relação a Harold, mas que, aos poucos, se vai envolvendo com ele; Queen Latifah vive a secretária de Karen Eiffel, e é, juntamente com Emma Thompson, responsável por alguns dos diálogos mais divertidos do filme, fruto do choque de ideias entre as duas personagens; Will Ferrell, por sua vez, interpreta Harold Crick com seriedade, capaz de nos fazer rir sem cair no erro de tornar óbvias as tentativas de comédia.

Se o final é discutível (na minha opinião, tinha de acabar assim, por mais previsível que possa ser, para que o filme resulte, mesmo que o livro fictício de Karen fique, assim, com valor decrescido) quanto à tal imprevisibilidade referida, devo dizer que o resto foi excelente, desde o sofrimento causado a Karen pelo seu bloqueio à mudança de Harold, passando, claro, por aquilo que deve ser o sonho de boa parte dos escritores (não digo “a maioria” para não cair numa generalização precipitada), o de ver uma personagem, uma criação, ganhar vida própria.



Original, irreverente, divertido e com uma mensagem interessante, “Stranger Than Fiction” consegue escapar às armadilhas do género e, embora caia um pouco no melodrama na recta final, não deixa de ser um excelente filme sobre a descoberta da vida, do afecto (a relação entre Harold e Ana Pascal é bem pensada do início ao fim, e a cena em que Harold vai ao apartamento dela é, a meu ver, uma das melhores do filme… arrisco-me quase a dizer que é a melhor, devido à “brincadeira” entre a banda sonora e acção) por uma personagem acomodada à vida mas que se vê, a certa altura, confrontada com a sua morte iminente. Compra obrigatória!

sexta-feira, julho 04, 2008

É preciso pontaria para se casar por amor!

A Igreja Católica continua a não esconder inúmeras contradições e parvoíces. Desta vez gerou polémica ao impedir os portadores de deficiências de casar apenas porque "não podem procriar". Um exemplo dessas proibições foi o de Pablo Damásio de Araújo, que possui paralisia cerebral e de Cláudia Araújo Vianna, que apresenta défice de aprendizado, que foram impedidos de casar pelo padre João Pedro Stawicki.
Pergunto-me que consistência tem esta proibição, que direito tem um padre para impedir duas pessoas que se amam de casar. Nos casamentos ouvimos sempre aquelas coisas muito românticas, de um casal estar junto no bem e no mal, e que o casamento é uma união entre duas pessoas que se amam. Não era o que este casal queria fazer? Nunca ouvi num casamento um padre a dizer que o casamento é uma união com o objectivo único de procriar e penso que, se muita gente o soubesse, não se teria casado. Quantas pessoas não se casam e depois vêem que são inférteis? Quantos casais decidem não ter filhos? Adoptar? E a igreja não de opõe. Outra coisa que ouço muito é que nunca se deve casar por interesse, que se deve casar por amor. Não me parece que a igreja o permita sempre, pois se duas pessoas se juntam apenas para procriar não é amor, é interesse.
A Igreja cai no ridículo e nem sequer disfarça. Se é assim tão contra o aborto, então porque não deixa este casal casar? É garantido que nunca vão abortar! Deviam aliar-se, hein? Ou então tomemos o exemplo dos homossexuais. Num casamento homossexual é um bocado difícil existir um aborto! A Igreja não devia então apoiar estes casamentos?
Anda tudo trocado, até a suposta fonte de moral se revela a mais imoral de sempre.
Desejo já agora as minhas felicidades ao casal, que mesmo sem festa religiosa organizou uma festa e estão agora juntos pelo amor.