sábado, junho 25, 2011

Música com Cinema (3): Blur e Sigur Rós


The Universal, dos Blur
Realização: Jonathan Glazer
1995

Autores de uma das mais consistentes obras discográficas do pop/rock alternativo dos anos 90, os Blur cedo descobriram uma forma igualmente competente de encarar a imagem como complemento directo para as suas canções. As capas dos primeiros singles e álbum sugeriam já esse relacionamento que, com o tempo (e os orçamentos mais nutritivos que o sucesso lhes deu), ganhou forma ainda mais notável em telediscos nos quais vincaram a vontade de expressão de um olhar cinematográfico. Em To The End, assinado por David Mould em 1994, citaram em concreto o clássico O Último Ano em Marienbad, de Alain Resnais. Mais tarde, em No Distance Left To Run (1999), chamaram Thomas Vinterberg a assinar a realização de um teledisco que observa os quatro elementos da banda de noite, às escuras, durante o sono. Entre os seus feitos maiores da sua videografia conta-se ainda The Universal, teledisco rodado por Jonathan Glazer (então ainda longe de se estrear na realização de longas-metragens). Tomando como evidente referência visual o espaço do Korowa Milk Bar de A Laranja Mecânica de Stanley Kubrick, o teledisco faz dos quatro elementos do grupo uma materialização da memória do pequeno “gang” que vemos no filme. Mas mais interessante ainda que este jogo de citações é a construção de um conjunto de situações centradas numa mão cheia de personagens que, sem experimentar sequer uma ideia narrativa, constroem em conjunto um quadro que define assim um ambiente e caracteriza um espaço. Há legendas que sugerem fragmentos de diálogos, olhares que traduzem estados de alma e, perto do final, um segredo que vemos, mas não escutamos, e que desencadeia um momento que podia morar num instante de um filme. Notas igualmente de destaque para a soberba direcção de fotografia e para um trabalho de montagem que sabe, mesmo numa canção de toada lenta, manter vibrante o ritmo dos olhares, gentes e gestos que se cruzam durante o teledisco.


O disco

Em meados dos anos 90 os Blur eram já um nome de absoluto primeiro plano da pop à escala mundial. No Reino Unido viviam então uma “batalha” (mais mediática que real) contra os Oasis, em tempos de euforia brit pop. Parklife, o seu terceiro álbum, editado em 1994, cimentara esse estatuto de protagonismo no panorama pop/rock, sem que tal representasse um instante de cedência por parte da banda quanto às intenções da sua obra e formas a expressar na sua música. De longe o menos esforçado dos álbuns do grupo, The Great Escape foi então (em 1995) um disco mais de continuidade que feito de olhares lançados adiante. Mesmo assim há no alinhamento do quinto álbum de originais dos Blur alguns instantes dignos de morar entre as peças de referência da sua obra. Entre eles The Universal, canção escolhida para ser o segundo single extraído do alinhamento desse disco. Uma balada eloquente, de carga sinfonista (e com um magnífico arranjo para cordas), The Universal tornou-se com o tempo num dos temas-chave da obra dos Blur e é, claramente, uma das mais belas canções pop, com travo clássico, dos anos 90.

Nuno Galopim


Viðrar vel til loftárása, dos Sigur Rós
Realização: Stefán Árni Þorgeirsson e Sigurður Kjartansson
2001

Contextualizado na Islândia dos anos 50, dois clubes júnior de futebol confrontam-se em campo e, ao vencer o jogo, dois colegas da mesma equipa celebram beijando-se, expondo a sua intimidade aos pais, que os separam. A ideia partiu de Ágúst Ævar Gunnarsson, baterista fundador da banda Sigur Rós (que, entretanto, desiste em integrar o grupo em 1999, antes do seu sucesso internacional), e foi concretizada pela dupla de realizadores Stefán Árni Þorgeirsson e Sigurður Kjartansson. Teledisco sobre o amor e a violência, este é um dos grandes casos de como a forma poética da música (e da respectiva letra, como a tradução em inglês do teledisco disponibilizado em cima nos faz compreender) encontra paralelo com a do vídeo. A separação do protagonista das suas bonecas feita pelo pai representa assim a antítese que vive neste pequeno filme: o comportamento natural contra o que é imposto; o colectivo contra o individual; a sociedade contra um certo tipo de amor. A bela fotografia (situada em Reiquiavique), e o slow motion (que existe do início ao fim) parece querer chamar a atenção para estes pequenos acontecimentos, comportamentos e sentimentos – e são os próprios Sigur Rós, apologistas da liberdade, a apresentarem-se como parte dessa observação, surgindo no teledisco em diversos cameo. Jón “Jónsi” Þór Birgisson (vocalista e guitarrista) é o treinador da equipa vencedora; Georg "Goggi" Holm (baixista) é o árbitro; Kjartan "Kjarri" Sveinsson (teclista) é um dos espectadores; Orri Páll Dýrason (baterista) é quem aponta os golos. Este é ainda citado como um dos telediscos mais relevantes para a comunidade homossexual, por mostrar a pureza e a violentação do seu amor.

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