sábado, junho 04, 2011

Música com Cinema (1): Bob Dylan e James Blake

Porque os telediscos também podem ser uma força de expressão cinematográfica, inicia-se hoje, no blogue, a rubrica Música com Cinema, assinada pelo jornalista, crítico de música e um dos autores do sound+vision Nuno Galopim e por mim.

Subterranean Homesick Blues, de Bob Dylan
Realização: D.A. Pennebaker
1965


Muitas vezes apontado como o primeiro filme promocional musical da história (chamemos-lhe teledisco, para usar um termo que entre nós fez escola), o pequeno “clip” que acompanha Subterranean Homesick Blues nasceu, originalmente, para o cinema (em concreto para Don’t Look Back, o histórico documentário sobre Bob Dylan assinado por D. A. Pennebaker).

Numa pequena viela londrina vemos Bob Dylan num plano único. Nas mãos tem uma série de cartões nos quais vamos lendo palavras-chave do poema que faz a canção, o músico atirando-os para o lado à medida que a letra avança... Há gralhas e erros propositados, não representando estas palavras a tradução fiel de elementos que a voz canta. Os cartões foram, ao que parece, escritos à mão pelo próprio Dylan, com ajuda de, entre outros, Donovan e Allen Ginsberg, este último surgindo bem evidente no canto esquerdo da imagem, atravessando a rua nos segundos finais do pequeno filme. Em Don’t Look Back estas imagens surgem cruzadas com outras, pensadas sob lógica idêntica, mas captadas em outros lugares da mesma cidade. Isolado, este plano único tornar-se-ia naquele que acabaria reconhecido como o primeiro “teledisco” da história.

A força da ideia ganhou com os anos um estatuto de referência e conheceu inúmeras citações e revisitações em telediscos posteriores, entre os quais Misfit dos Curiosity Killed The Cat ou Scream and Run Away dos Gothic Archies (um dos projectos paralelos de Stephin Merritt dos Magnetic Fields).

O disco

Subterranean Homesick Blues foi o primeiro “êxito” de Bob Dylan no formato de single (facto que se mede por ter representado a sua primeira entrada nos 40 lugares mais altos do Hot 100 da revista Billboard). Originalmente lançado como single em Março de 1965, a canção surgiu depois no alinhamento do álbum Bring It All Back Home, do mesmo ano. Subterranean Homesick Blues corresponde a uma das primeiras composições “eléctricas” de Bob Dylan.

Nuno Galopim

Lindisfarne, de James Blake
Realização: Martin de Thurah
2011


Lindisfarne é o terceiro teledisco de James Blake (sendo que os dois anteriores são Limit to Your Love, realizado por Martin de Thurah que aqui regressa, e Wilhelms Scream, dirigido por Alexander Brown, autor do teledisco Umbrella Beach, de Owl City), uma das maiores revelações na música electrónica britânica deste ano. Acompanhando a estranheza proporcionada pela música (e a letra), de Thurah fala-nos da última noite que um grupo de amigos passa junto. Aproximando-se a partida da protagonista, o grupo resolve realizar uma espécie de ritual simbólico e no qual a rapariga se une com os companheiros. A figura do cantor aparece como um fantasma que observa, neutro, a cerimónia. Ritmando com as batidas da canção (que congrega as duas partes presentes no álbum James Blake), Lindisfarne é sobre o amor por uma irmandade e a privacidade secreta da amizade. Bizarro e profundamente intimista, Blake e de Thurah mostram aqui, a partir de uma bela e suave fotografia, o melhor que se consegue fazer nos telediscos contemporâneos.

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