domingo, abril 04, 2010

Código Desconhecido

A linguagem tem uma vida própria. A constatação, que podemos considerar factual, apenas serve para minimizar e englobar a dinâmica, recheada de uma rude imprevisibilidade, que é inerente à comunicação entre os seres humanos. O que é o mesmo se disséssemos que o homem tudo e nada sabe de si e da forma como há-de interagir com os sistemas interpessoais que lhe rodeiam. O Código Desconhecido é, na maior das probabilidades, o mais interessante (e arriscado) da filmografia de Michael Haneke, ao lado d’O Sétimo Continente (crítica), que se demonstra mais subentendido e fechado numa só narrativa. Pela câmara gelada que filma, com uma vontade quase voyeurista, um récit incomplet de divers voyages, pela actualidade, pela crueza com que trata a mais dura violência (a que não se vê e a que se exprime na insensibilidade) do mundo contemporâneo e tecnológico. As falsas lágrimas de Binoche são o choro contido de uma sociedade perdida e desesperada por sair da sua zona de conforto. Sem moralismos, aqui, ainda que de forma não contraditória, tudo se pode considerar ambivalente ou até mesmo desconhecido, como trata o título original – pois, apesar de descrever uma realidade que nos é demasiado próxima, o austríaco parece criticar e responsabilizar todas as guerras, toda a manipulação e até mesmo toda a indiferença à Babel que não sabe educar ou educar-se. E, após uma arrepiante sequência contextualizada num metropolitano (que vos deixo em baixo), como se entrássemos num filme de Hitchcock, tudo começa a culminar estranhamente, como que a antecipar um negro, negro fim. Mas, em vez de terminar, a obra, sem dúvida de arte, estende-se e sai à nossa actual existência, deixando-nos a oportunidade para acabar o filme, para desvendar um código que, mais que incógnito, é inteligível e, logo, passível de ser aproveitado em prol de uma positiva mudança de postura, que é necessária na humanidade que corre demasiado depressa. Absolutamente obrigatório.
9/10

10 comentários:

  1. É, provavelmente, de entre aqueles que conheço e a par de FUNNY GAMES, o meu filme favorito de Michael Haneke. Grande grande filme.

    5/5

    Cumps.
    Roberto Simões
    » CINEROAD – A Estrada do Cinema «

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  2. É engraçado que comprei o pack do Haneke mais por causa d'A PIANISTA. No final, acabei por gostar muito mais deste e do FUNNY GAMES ;D Foi uma excelente compra ;D

    Cumps.
    Roberto Simões
    » CINEROAD – A Estrada do Cinema «

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  3. Este nem o tenho, nem vi ainda, mas tenho bastante curiosidade!

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  4. Eu tenho de começar a ver Haneke! Da forma como tu o descreves e outro pessoal do blog, eu tenho de ver!

    Abraço
    Cinema as my World

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  5. Roberto, é dos meus preferidos também. Sabes, quando o acabei de ver, apesar de ter adorado completamente, não o consegui destacar de todos os outros. Tempos depois, como vês, já o considero o melhor a par d'O Sétimo Continente, que é uma obra-prima. É um filme importantíssimo, que todos deveriam ver e reflectir, não achas? :)

    Tiago, vê então. Vais gostar muito, de certeza.

    Nekas, este é um realizador que não deixa ninguém indiferente. Sei que gostaste do Brincadeiras Perigosas mas ele tem outros filmes que valem a pena dar uma espreitadela. Já vi quase todos os filmes da sua filmografia (apenas não vi "O Castelo" e "71 Fragmentos de uma cronologia ao acaso") e dos que escrevi aqui no blog aconselho-tos todos.

    Abraço

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  6. Eu gosto de ver este CÓDIGO DESCONHECIDO um pouco como o pai ou avô do BABEL ;D É uma analogia um tanto ou quanto desnorteada, mas compreendes-me?

    Cumps.
    Roberto Simões
    » CINEROAD - A Estrada do Cinema «

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  7. Não é desnorteado, porque é mesmo um pai de Babel e de tantos outros. Mas há algo no Código de mais universal e potente, que consegue funcionar melhor na sua reflexão sobre a relatividade cultural e dentro da própria sociedade. Babel é mais, diria eu, positivo e menos negativista quanto à sociedade - porque demonstra a união de circunstâncias e das pessoas, e de como é importante a entreajuda e o amor.

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  8. Ando para comprar o pack de Haneke, mas o seu preço deixa-me sempre de pé atrás. Parece-me que tenho mesmo de o adquirir!

    Abraço

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  9. Marcelo, compra, vais adorar completamente este. Também vale para reconhecer a qualidade do primeiro Funny Games. Quanto ao preço: há alguns que sacam, sabes?

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  10. Marcelo, compra! De certeza que já gastaste dinheiro mais mal gasto, como todos nós! Vale mesmo a pena. E o pack é uma preciosidade.
    Só os extras dos DVDs... são francamente bons! Refiro-me às entrevistas, muito boas.

    Cumps.
    Roberto Simões
    » CINEROAD - A Estrada do Cinema «

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