Como boas almas já devem (ou não) saber, o meu terrível e ousado desejo de continuar os estudos para seguir um curso de cinema mantem-se, e o tempo para lá ir aproxima-se mais ou menos rapidamente. No que me compete, a decisão do instituto que vou cabe-me inteiramente a mim, e em Portugal, apesar de precária a existência de reconhecidas escolas superiores, há algumas que me despertam o interesse. Uma delas fica em Amadora, Lisboa: a ESTC, ou Escola Superior de Teatro e Cinema, que me parece muito boa. Ora, lá fui eu à pesca na Internet e encontrei um
blog (por sinal muito interessante) em que o autor comentava a sua
estadia. Apesar do início me entusiasmar, o retrato pintado fica negro (não que os factores evidenciados no texto sejam determinantes na minha decisão futura). Achei por bem partilhá-lo convosco, e aqui vai:
(...) Durante a semana que passei na Escola na época de selecção, consegui começar a desenhar as linhas que saíam daquelas pessoas que por lá andavam e procuravam conseguir entrar para o curso. Poucos diziam bom dia e poucos sabiam manter uma conversa sem falar sobre o Gus Van Sant, que realizava excelentemente, ou sobre a estranheza do Inland Empire ou mesmo sobre o mau jeito de Kate Hudson para representar. Havia toda uma procura em ser-se mais sabedor sobre determinado filme ou em arranjar argumentos rápidos e inteligentes que conseguissem defender uma obra pessoalmente adorada. Essa mesma semana foi suficiente para haver segredos, conflitos, competições, más línguas, juízos de valor. Na sexta-feira, não tinha a certeza se conseguia dizer que tinha gostado. A vida lá na Escola?
A vida lá na Escola é cinzenta. Cinzenta como os corredores frios e vazios que atravessam todo aquele edifício. Cinzenta como o silêncio de quem por eles passa solitariamente. Cinzenta como os olhares distantes daqueles que não brincam durante os intervalos. Cinzenta como o fumo do tabaco de todos os que fumam constantemente nas pausas. Cinzenta como o pássaro morto há 3 semanas, que, lentamente, se decompõe nos vidros do tecto de um dos poucos corredores expostos à luz exterior. A vida lá na Escola não é a vida que eu esperava. Somos poucos para uma turma de faculdade - 34 - e, em vez de haver um ambiente familiar propício a conversas em volta de uma fogueira, existe um ambiente amargoso em que todos gritam salve-se quem puder! de forma discreta. Todos querem ser melhores que todos. Todos querem aperfeiçoar os seus trabalhos, fazendo o dobro ou, por vezes, o triplo daquilo que é pedido (imaginem as implicações a que este último remete). Todos querem brincar aos adultos.
Os alunos de Cinema pouco ou nada falam com os alunos de Teatro. Os alunos de Cinema pouco ou nada falam com os alunos de Cinema de anos diferentes. Os alunos de Cinema não têm tempo para actividades que os façam descansar (mas eles querem descansar?). Os alunos de Cinema não se divertem quando têm tempo. Os alunos de cinema acham estranho quem brinca quando tem tempo. Os alunos de cinema acham interessante e novo quem brinca quando tem tempo. Os alunos de cinema são fechados e nada extrovertidos.
Talvez seja a falta de espírito académico que faça aquela Escola ser tão cinzenta, apesar das suas paredes exteriores estarem brilhantemente pintadas de amarelo. Aquelas pessoas parecem ter pavor a tudo aquilo que se relacione com o espírito académico. Eu? Eu tenho dificuldades em viver ali. Entro às 9.30 e saio, na maioria dos dias, às 20h e nã0 tenho tempo para ter uma vida fora daquele lugar. A Escola exige demasiado da minha pessoa. Sinto-me integrado, obviamente, mas não sei se quero fazer parte daquele lugar e fazer daquilo a minha casa durante os próximos 3 anos. Se o fizer, preciso de me agarrar a alguma coisa dentro daquele mundo, que, ao mesmo tempo, me evada do mesmo.