sexta-feira, agosto 06, 2010

Hannah e as suas Irmãs

É já sabido pelos leitores deste espaço que Woody Allen se mantém como uma referência minha quando falo do cinema como arte, do cinema como procura essencial do que somos e das grandes questões da vida. E da morte. Penso que ele é dos pouquíssimos cineastas que consegue vislumbrá-las essenciais, com um olhar muito preocupado e, ao mesmo tempo, relaxado, reflectindo e rindo-se delas. É precisamente sobre elas que, muito à semelhança do que se fez com outros trabalhos do norte-americano (como Nem Guerra, Nem Paz, etc.), esta comédia se debruça, sem, contudo, as colocar como principal pano da trama. A razão pela qual o tom das suas obras se mantém a referida é simples e única, mas eficaz – o facto de Allen se defrontar com uma vida enigmática e impossível de resolver, e que assim permanecerá até o fim dos seus dias, com toda a tragédia e ironia que lhe é inerente. É, precisamente, com Hannah que isto se demonstra com mais clareza, por via da personagem secundária encarnada pelo homem, um hipocondríaco neurótico que busca o significado da vida com Sócrates, Nietzsche, a religião católica, uma tentativa de suicídio, um filme de infância e o achado novo amor. É, também, este que sintetiza a essência desta obra que viaja por dentro de várias cenas de casamento, passando pela traição, a lealdade, a irmandade, o valor da família e a paixão – tudo sabe a um tragável (mas misterioso) conjunto de acasos, como se a própria vida fosse assim mesmo, para ser, só e simplesmente, vivida.

6 comentários:

  1. Tb gosto muito do Woody. Se pudesse, tê-lo-ia escolhido para meu prof de Filosofia na faculdade... Todos os profs de filosofia deviam ser como ele!

    ResponderEliminar
  2. Os filmes do Woody ( na generalidade) sao sempre fantasticos. Gosto em particular dos filmes feitos com a mia Farrow e com a Diane Keaton.

    Excelente blog flavio

    ResponderEliminar
  3. Alexandre, sem dúvida que deviam eheh ;)

    João, concordo, mas tenho achado o recente Allen muito inconsequente... ele até diz que faz os filmes para não se aborrecer ;) Muito obrigado pelo elogio, e bem-vindo :)

    ResponderEliminar
  4. Um grande filme do Woody, como o foram todos desta sua fase e como o ainda são alguns mais recentes (v.g., Match Point).

    É brilhante essa personagem neurótica e perturbada com o existencialismo, de que falas. No fundo, não o é apenas aqui, em Hannah, mas sim em vários filmes, como se, vendo todos seguidos, ficássemos com a impressão de que está em todos eles.

    Este é um daqueles em que Woody retrata com incrível sobriedade e humor as complexas teias das (de algumas) relações familiares (especificamente as que se subsumem ao amor entre o homem e a mulher).

    ResponderEliminar
  5. Flávio, penso que é a primeira vez que comento n'O Sétimo Continente, mas não é a primeira vez que aqui venho. Depois de teres concordado com a minha opinião sobre UM CIDADÃO EXEMPLAR, fui acompanhando o teu blog, e comento este post, muito simplesmente devido à primeira frase da tua crítica.

    Também eu tomo Woody Allen como uma grande referência na sétima arte, apesar de já ter encontrado alguns cépticos irritantes que não compreendem o seu cinema. Mesmo sem ter visto este seu filme, conheço uma boa parte da sua imensa filmografia, e não tenho dúvidas de que Allen é um dos mais marcantes cineastas de toda a história desta arte. Ou, aliás, de toda a arte (não fosse Allen um artista multifacetado).

    Voltarei a passar por aqui, e no CineGlam7 também serás sempre bem vindo, para discutir esta arte.


    Cumprimentos,

    Gonçalo Lamas

    cineglam7.blogspot.com

    ResponderEliminar
  6. Diogo, concordo em absoluto. É engraçado reparar neste despertar para o existencialismo e os temas da morte a que muito vai recorrer depois, na obra "Nem Guerra Nem Paz", que te aconselho, caso ainda não tenhas visto. Há referências directa a'O Sétimo Selo, de Ingmar Bergman, que, como sabes, é o preferido de Woody Allen e grande inspirador para sua obra (não no tom, certamente). As relações amorosas aqui estão, sim, muito bem desconstruídas, pelo menos as tradicionais, por assim dizer. Match Point foi a sua última grande obra. Parece que agora o seu medo de morrer (ou tédio de viver) o fizeram fazer filmes de forma muito inconsequente.

    Gonçalo, estou muito agradecido pelo comentário. Aconselho-te o filme. Voltarei ao teu blog, também.

    ResponderEliminar