domingo, outubro 25, 2009

:Dancer in the Dark



Na altura em que Cannes foi presenteado com a nova longa-metragem de Lars Von Trier, e que fez lembrar o precedente “Ondas de Paixão”, a crítica viu-se numa divisão ambivalente quase total, pondo aqueles que o odiavam e consideravam uma desilusão num canto e noutro os que o amavam e enalteciam o sentido inovador da narrativa. A luta foi ganha, claramente, por aqueles que a adoravam - e tal foi comprovado com a entrega da Palma de Ouro ao realizador e o prémio de melhor interpretação feminina a Björk, pelo musical atípico que trouxe, tempos depois, uma grande legião de fãs. Se, contudo, esta pequena obra surpreende largamente pela metamorfose da actriz, peca, paradoxalmente, pela personagem revoltante que esta encarna. Ou, melhor dizendo, pela composição geral de todo o melodramático argumento (a tentar ter, a todo custo, alguma credibilidade) e de todas as personagens, e que se movem no fio espectral da estupidez. Von Trier constrói uma parábola sobre a humanidade que podia primar pelo brilhantismo não fosse o sentido novelesco que foi exaltando - comprovado pela série de acontecimentos impossíveis (ou será que existem, realmente, pessoas tão cegas sobre a sua condição?!) que se vão sucedendo, uns atrás dos outros - e não, não me refiro às sequências musicais fantasiosas, que estão espectacularmente executadas - e que vêm a culminar numa poética cena final. Para amar Dancer in the Dark, este filme de sucesso com um estilo que respira novidade e beleza, músicas prodigiosas e interpretações simplesmente notáveis, há que amar as personagens em toda a sua essência, não vá a sua visualização resultar numa insustentável experiência.

7/10

4 comentários:

  1. Li a tua crítica duas vezes mas não entendi bem quais os defeitos que apontas. Selma peca por suscitar revolta? Como assim? O que mais apontas em relação ao filme?

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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  2. Olá Roberto, não desenvolvi mais alguns aspectos porque quis evitar dar spoilers. Selma é uma personagem revoltante - na medida em que a considero irracional e até um pouco idiota. Porquê? Basta pensar em tristes situações que ela, caso tivesse dado uso ao bom senso, poderia muito facilmente ter invertido (o roubo, o tribunal, a execução, a sua progressiva cegueira, etc., etc.), mas que não o fez, por medo ou, talvez, por prever sempre o pior dos cenários. Enfim, acho que as personagens, e principalmente a protagonista, estão mal construídas e desenvolvidas. Creio, assim, que Von Trier construiu um argumento um tanto pretensioso e manipulador.
    Espero ter sido esclarecedor!...

    Abraço!

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  3. Sim, agora foste mais claro. Estou em desacordo quanto a Selma. Ela o que é - é profundamente humilde, tímida, fechada... e essa maneira de ser justifica todas as suas reacções com verossimilhança. Porque há, acredita, muitas pessoas assim, eu próprio conheço algumas. E isso é que nos condói por dentro. Pelo menos a mim... saber que se aproveitam dela. Ela é idiota? Talvez, mas é idiota por ter um coração bom demais, sem maldade. Para mim, um dos melhores papéis femininos desde que há cinema.

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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  4. Selma tem claramente um espírito de sacríficio. Esse conceito é maioritariamente irracional, porque funciona quase como um instinto, logo é natural essa percepção com que ficamos perante a personagem de Björk. Para mim, é um filme fantástico e um desempenho soberbo.

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