Entre Michael, que Markus Schleinzer estreou no ano passado no Festival de Cannes (em secção competitiva), e Michael Haneke a diferença é… “diferença”??
Eis enunciado o nosso problema: Schleinzer, cuja experiência profissional em cinema passa pelo trabalho como diretor de castings, essencialmente em séries de televisão (lembram-se de Rex, o cão polícia?) e nos filmes de Haneke (a partir de 2001, com A Pianista, passando ainda pel’O Tempo do Lobo e o recente O Laço Branco), parece ter feito algo que cai, num primeiro relance, no deslumbramento formalista daquele que é agora considerado um novo cinema austríaco (uma designação que é, na verdade, absolutamente insignificante quando é apenas Michael Haneke o seu protagonista).
A mise-en-scène de Schleinzer, que quer em tudo adequar-se a uma ideia de falsa normalidade, ou normalidade produzida (ideia cinematográfica fortíssima, que acaba por nos desmascarar a todos – do pedófilo protagonista ao espectador), não é mais senão uma ponte para o trabalho de câmara, rígida como uma câmara de vigilância e tão austera que “parece” Haneke.
Mas não nos deixamos cair — Schleinzer finge, com esse trabalho, fugir ao sensacionalismo, unilateralidade e influência televisivas para, paradoxalmente, procurar imagens cuja violência gratuita nos fazem crer que estamos perante um indiscutível “filme-choque” (à memória vem a cena da televisão no filme de Schleinzer, que é determinante para o momento mais grotesco). O que ainda é também perturbante é a ausência de pontos de fuga numa história que prima por uma previsível banalidade. E nem mesmo as cenas em que o protagonista faz desajeitadamente sexo com uma mulher, em que o miúdo tenta escapar ou o final nos satisfazem: como se Schleinzer pusesse a sua fé no assunto “pedofilia”, mostrando-nos os sintomas de um caso como qualquer outro, como se tal bastasse para estabilizar uma narrativa — não, não basta.
No limite, é uma questão moral. Schleinzer recusa o moralismo tabloide para privilegiar uma insensibilidade obscena — e é, infelizmente, talvez apenas nisso que é original.
É um ponto de vista interessante, ainda não vi o filme, mas admiro o estilo do Haneke (que este filme parece copiar) pela sua neutralidade. Já agora, quanto a cinema austríaco há também o grande Ulrich Seidl, Import/Export é um óptimo filme :)
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