Margarida Gil, realizadora e presidente da Associação Portuguesa de Realizadores (APR), reage com preocupação aos anunciados cortes na Cultura. “Vivemos um período muito perigoso, e esta é uma estratégia de corte que vem de trás”, diz a realizadora de “O Anjo da Guarda”, fazendo notar que esta “operação de putschismo” relativamente ao cinema já vem de 2004. E acusa a ministra de falta de diálogo com os realizadores, referindo que a APR lhe apresentou um completo dossier sobre a situação do cinema português, sem que Gabriela Canavilhas tivesse depois feito qualquer eco ou mostrado “qualquer interesse” em ouvir os realizadores sobre o futuro.
Margarida Gil diz que “o cinema português está já no limiar da sobrevivência”, e envolve muita gente que se encontra “sem trabalho nem perspectivas”. Considera que, com as medidas agora anunciadas, a ministra está a “tapar os horizontes deles com a maior das friezas”. “Não pode haver um país sem cultura e com ela a ser tratada desta maneira”.
A presidente da APR acredita, no entanto, que as pessoas irão “unir-se e reagir”, e isso deverá ser mostrado já na próxima segunda-feira, dia para quer foi convocada uma reunião aberta a todos os profissionais do cinema, em Lisboa.
Também Tino Navarro, presidente da Associação de Produtores de Cinema (APC), vê os cortes anunciados como extremamente “penalizadores” da actividade cinematográfica, e por isso manifesta “muita preocupação”. Mas o produtor considera que é preciso saber em que moldes é que vai ser feita a aplicação desses cortes e restrições no domínio do cinema. É isso que a APC espera ver esclarecido numa reunião já agendada para a próxima terça-feira com o presidente do ICA - Instituto do Cinema e do Audiovisual, José Pedro Ribeiro. Só depois desse encontro, a associação irá tomar uma posição clara sobre a situação.
O realizador e produtor António Ferreira, de Coimbra, vê “sem surpresa” o anúncio dos cortes na Cultura. “Estamos em crise, não vejo por que é que a Cultura iria ser excepção”, admite o realizador de “Embargo” (filme adaptado de um livro de José Saramago, e que tem estreia nacional agendada para 30 de Setembro). “Mas eu gostava era de ouvir falar na criação de uma nova Lei do Cinema que fosse um verdadeiro modelo de sustentabilidade e de autonomia para o sector, para que ele se liberte em definitivo da subsídio-dependência”, acrescenta António Ferreira, que considera prioritário alterar também a Lei do Mecenato, para criar mecanismos que favoreçam o investimento privado no cinema, e também na Cultura em geral, que “está no limite do viável”.
A uma semana do início da 18ª edição do festival Curtas Vila do Conde, Dario Oliveira, um dos membros da direcção, diz que esta estratégia de cortes generalizados é “uma forma perversa” de resolver a crise. “Que se corte na verba de aquisições para a Colecção Berardo e em muitos outros maus negócios que o Estado vem fazendo nos últimos anos, muito bem. Mas não nas condições de trabalho dos artistas e dos agentes culturais”, diz Dario Oliveira.
O programador critica Gabriela Canavilhas por aceitar esta forma de “operacionalizar as decisões do Governo” sacrificando, uma vez mais, “de forma cega”, o sector da Cultura. Relativamente ao festival de Vila do Conde e a outros festivais do país, Dario Oliveira diz que estes cortes “são injustos” e, utilizando uma linguagem futebolística, considera-os também “uma rasteira e uma atitude de muito mau tom”, porque significam “mudar as regras a meio do jogo”, algo que “ninguém pode aceitar”. Isto significa, na sua opinião, comprometer a possibilidade de realização de muitos festivais e também de produções cinematográficas que serão cortadas, e mesmo paradas a meio.
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Cada vez menos acredito no funcionamento desta política de esgoto, assassina de tudo o que é criação artística. E, ao contrário do que transponho acima, também não acredito que, verdadeiramente, vá acontecer uma revolta, na certa acepção do termo, para que tudo isto regenere, para que o cinema português encontre a sua alma, o seu caminho. Para haver revolta tem que haver revoltados. E se, típicos e previsíveis como somos, nos mantivermos nesta eterna e passiva posição de espectador, nada se verá no plano da acção - nada de nada, e só alimentaremos uma raiva interior que rasga e mutila o que nos pertence. O que é o CINEMA num PORTUGAL perdido, sem futuro nem esperança? O que será toda a cultura, detentora daquilo que pode realmente dizer algo ao ser humano, numa terra onde abundam fait divers, fátimas, futebóis e fados e escassa o gosto pela arte? Não será. O cinema português morreu há muito tempo, e vivemos frente a um cadáver que insiste em marcar presença como um fantasma que não vemos mas está ali , a querer tornar-se corpo.
É triste. Continuamos a orgulhar-nos do nosso atraso cultural, filosófico e artístico. Ser-se atrasado no PIB, na inovação ou na balança comercial é ser-se um país atrasado. Ser-se atrasado na cultura, na reflexão, na arte, na identidade, isso já é ser-se um povo atrasado.
ResponderEliminarTambém deixei um comentário sobre tudo isto no meu blog.
E lanço outra questão: não poderá a privatização da Tobis trazer bons resultados ? Acredito que sim.
Isto é um país que caminha para o abismo...
ResponderEliminarMuito boas palavras Flávio.
ResponderEliminarPortugal e, consequentemente, o cinema português, atingiu um nível tão degradante que dificilmente sairá dele mesmo. Se por um lado o estado retira o pouco que dava de apoios à arte, por outro, aumenta os preços e a inflação o que torna os projectos independentes ainda mais escassos. Como disseram, o país caminha para um abismo, não, o país está no abismo, resta saber a profundidade do buraco e o quanto já estamos lá enfiados...
Abraço
Cinema as my World
Por um lado, Diogo, concordo com a privatização da Tobis - demonstra apenas que se vai começar a engrenar nesses termos. Por outro, é preocupante que tal tenha que suceder, demonstra só o desprezo contínuo e enorme que o governo português sente pela arte, mais particularmente pelo cinema. Mas não acredito que vá evitar a morte. É preciso muito, muito mais, é preciso revolução, chamar a atenção dos papagaios estatais, criar um movimento que se insurja contra tudo o que é rejeição artística.
ResponderEliminarVictor, nem mais...
Bruno, resta lutar para de lá sairmos... o que falta é vontade...
Flávio: Precisamente. De qualquer forma, temos de partir para as coisas tendo em conta que o Estado já não quer saber. Lamentamo-nos, é certo, mas deixemos isso de lado, por agora.
ResponderEliminarPrivado. Será solução ? Estive a ver uma entrevista ao João Fonseca da Costa que acha que, assim, a Tobis fica entregue aos especuladores imobiliários, faltando pouco para ser substituída por prédios e urbanizações, nunca tendo futuro por não ter um plano de acção definido.
Sinceramente, acho que pode resultar ao contrário (e talvez seja uma ingénua esperança). O investimento privado pode surgir de um grande incentivo em levar as coisas para a frente, de uma genuína aposta que não está condicionada a um dever funcional, podendo advir daí uma estratégia adequada, nem que através da consulta dos mais variados entendidos e especialistas.